Disciplina não é opcional para os militares

By | 09/11/2024 5:37 am
Imagem ex-librisO Exército publicou em seu Boletim do dia 1.º de novembro uma diretriz cujo objetivo é “fortalecer nos integrantes do Exército, em todos os escalões, o entendimento e a aplicação da ética profissional e da liderança militar”. Na prática, o chefe do Estado-Maior, general Richard Nunes, espera que as novas instruções contenham a evidente politização de parte da tropa, mantendo-a coesa em torno dos “objetivos institucionais” da Força Terrestre.

Vê-se que, de fato, há um sério problema no seio do Exército quando um compromisso comezinho dos militares como esse – atuar com ética e respeitar a hierarquia – precisa ser reforçado por escrito pelo Estado-Maior, com o óbvio respaldo do comandante Tomás Paiva, entre os soldados. O chamado “pundonor militar” sempre foi ponto de honra para os membros do Exército, da ativa ou da reserva. Embora registradas em leis, normas e regulamentos, honra e ética nunca precisaram ser impostas ou lembradas – até a contaminação das Forças Armadas pelo golpismo de Jair Bolsonaro.

Dito isso, é louvável que, na prática, o documento publicado pelo general Richard sirva para relembrar aos seus companheiros de Exército, “fardados ou não”, como ele fez questão de enfatizar, que a disciplina e o respeito à hierarquia não são opcionais para os homens e mulheres de farda. Preocupado, com razão, com a desordem informacional que grassa no ambiente digital, ao qual os militares, como quaisquer cidadãos, têm acesso, o chefe do Estado-Maior ressaltou a importância de “desenvolver o pensamento crítico do militar, com base nos preceitos da ética profissional, para adequar-se ao ambiente virtual”.

A despeito da pertinência do alerta e da correção do objetivo, é forçoso dizer que o papel aceita tudo. Convém recordar que não foi por falta de leis, normas ou códigos de ética que militares indisciplinados, no melhor cenário, e sediciosos, no pior, afrontaram os valores das Forças Armadas e, no limite, o Estado Democrático de Direito. Regras, evidentemente, são fundamentais, mas viram letra morta quando aqueles que as violam, em alguns casos flagrantemente, não são punidos como deveriam.

Recorde-se, à guisa de exemplo, a leniência com que o Exército tratou a indisciplina do então general da ativa Eduardo Pazuello, hoje deputado federal. Em maio de 2021, o intendente Pazuello subiu e discursou em um palanque ao lado de Bolsonaro, no Rio, durante um ato que se prestou a uma espécie de desagravo após seu depoimento à CPI da Covid, no Senado. A óbvia violação do Regulamento Disciplinar do Exército e do Estatuto das Forças Armadas, que vedam taxativamente a presença de militares da ativa em atos de cunho político-partidário, ficou impune. O comandante do Exército na ocasião, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, arquivou o processo disciplinar aberto contra Pazuello por entender que “não restou caracterizada a prática de transgressão disciplinar”.

O caso Pazuello é paradigmático porque exemplifica, de forma gritante, o problema que se impõe à instituição – e que não será apenas uma nova diretriz que vai resolver. A leniência com a qual a indisciplina do hoje deputado foi tratada enviou uma mensagem perigosa de que o desrespeito à hierarquia e à ética pode passar impune quando certos interesses políticos estão em jogo. O compromisso com a ética e a disciplina que se espera das Forças Armadas não deve ser mera promessa, tampouco formalidade, mas sim uma prática assegurada por punições efetivas e rigorosas contra qualquer transgressor, independentemente de seu posto ou de suas relações políticas.

A politização faz mal para as Forças Armadas. Toda iniciativa para evitá-la é bem-vinda e será apoiada por este jornal. Porém, mais do que normas e regulamentos, que ademais já existem, só a punição efetiva dos transgressores terá o condão de manter as Forças Armadas, o Exército em particular, no trilho da normalidade institucional e, principalmente, dentro dos estritos limites de atuação que a Constituição fixou para os militares no regime democrático.

Comentário

Category: Nacionais

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *