(José Augusto Longo, no Patos Online)
E pra ser mais sincero também não gosto nada de final de ano.
A grande maioria das pessoas acha que somente nessa época, muitas coisas devem acontecer. Por exemplo: dar de comer aos pobres. E aí eu pergunto: se um ano tem 365 dias, por que somente na chamada “ceia do Natal” os pobres precisam comer?
Esse tal de papai Noel, pra mim, é uma chatice sem tamanho. Com cara de boiola e uma rouquidão de dar pena, sempre com o seu inseparável ró, ró,ró que me irrita, ele se apresenta nas imagens televisivas que promovem o Natal dos ricos, em pleno País tropical, numa carroça puxada por renas, quando, para ser mais real, deveria ser puxada por jegues, e somente distribui presentes àquelas crianças de posses, que nem dele precisariam para ganha-los. Estes, elas já os tem aos montões. Tanto é assim , que ele, esse tal de Noel, só encanta as crianças pobres que vão às grandes lojas ou shoppings apenas para vê-lo e de lá sair de mãos abanando e os corações partidos, incutindo precocemente em suas cabecinhas sonhadoras, um sentimento de inveja que caso não seja combatido se arraigará em seu seio pelo resto da vida, podendo trazer sérios prejuízos, não somente a eles, mas, a sociedade como um todo, uma vez que a vontade de ter, pode leva-los a praticarem atos desvairados e lesivos.
Esse tal de papei Noel é uma afronta à pobreza. Foi criado, não pelo sentimento religioso de lembrar Cristo, mas, isto sim, com sentido mercantilista, comercial. E como é que ele poderia, com toda esnobação que se apresenta representar Cristo? Ora, segundo as escrituras, Cristo foi pobre, muito pobre, nasceu numa manjedoura e nunca saiu Palestina afora, empurrando um carrinho cheio de presentes para distribuir com pobres ou ricos. O que Cristo pregou, e distribuiu a crianças e adultos, foi a Palavra, a pregação da igualdade e nunca, mais nunca mesmo, a apologia ao gasto exacerbado e indiscriminado que somente os ricos se dão ao luxo de exercitar, diferentemente desse Noel, que exalta a riqueza, em detrimento dos pobres.
Se meter a cristão somente aos fins de dezembro, é querer enganar a Deus, a quem ninguém engana. Propalar o nascimento de Cristo, apenas em 25 de dezembro e se emperequetar todo para ir às igrejas se mostrar, é desconhecer que Cristo, para os verdadeiros cristãos, nasce todos os dias em nós, desde que, em seu nome pratiquemos atos que condigam com o que pregou: a igualdade, e nunca a separação de classes sociais, onde pobre só janta no Natal e onde somente os meninos filhos de ricos e remediados possam receber presentes numa data específica e os filhos dos pobres, quando muito, os brinquedos quebrados, desmantelados ou obsoletos, que as crianças abastadas rejeitam e jogam no lixo, e que alguns “caridosos” de plantão, muitas vezes – há exceções, é claro – mais para aparecerem aos olhos da sociedade, do que por pura caridade, saem periferia a fora, distribuindo com a garotada que passa o resto do ano esquecida em seus casebres de papelão, em suas casas de taipa, brincando com ossos e castanhas, de pés descalços, pisando na lama fétida dos esgotos que a Prefeitura dos ricos esquece de construir pois, como o papei Noel, também os prefeitos trabalham mais para os poderosos que financiam suas caras campanhas. Para estes, pobre é povo, e povo pra eles, é apenas um detalhe, um detalhe que somente os interessa nas campanhas, quando é procurado para trocar seus “ricos” votos por migalhas. Até na esnobação, os prefeitos se parecem com esse tal de Noel. Todos os finais de ano enfeitam os centros urbanos onde residem ou comercializam os ricos, deixando que a sujeira e a lama permaneçam nos bairros onde residem os pobres e miseráveis.
Outra coisa que me incomoda e muito, é a hipocrisia. Muita gente passa o ano inteiro rogando pragas, mentindo, roubando, traindo e difamando, e no período natalino, posa de bonzinho, piedosamente desejando o que não deseja no resto do ano, onde impera o “salve-se quem puder”. Estes também são adeptos de papai Noel. Eles acham que, aparecendo simpáticos e cristãos, desejando “de coração” mil felicidades ao próximo que desprezou durante doze meses, apenas nesse período, podem limpar uma ficha que junto a Deus, deve estar mais rasurada do que a dos “sócios” da Petrobrás, junto à Polícia Federal.
Tal qual Jânio, que baniu do Brasil a briga de galos, precisamos que no Brasil apareça outro doido que repense alguns dos nossos hábitos. Esse papai Noel, por exemplo, tem que ser repensado. Ou ele atua o ano todo, levando moradia digna, educação, saúde e bem estar, também aos pobres e necessitados, ou tire suas renas da chuva e volte lá pra Lapônia, de onde dizem que veio e de onde nunca deveria ter saído, pois, para dar alegria às crianças de pais ricos, não precisamos dele por estas bandas. Que ele vá fazer inveja aos meninos pobres lá no Polo Norte e deixe os nossos em paz, brincando com seus ossinhos e castanhas, inocentemente sonhando, entregues à própria sorte até que um dia, quem sabe, apareça por aqui, algum político cristão de fato, não os que se locupletam com o erário, que dão dinheiro público às festas mundanas somente para sair bem no retrato, mas, quem sabe, alguém que, saído das camadas menos favorecida, sem sobrenome pomposo, sem pertencer a família tradicional possa, sem precisar de nos irritar com o ró-ró-ró cavernoso, dar um pouco de dignidade a essa garotada que vem aprendendo cedo a amargar as diferenças de ordem social, dando a elas um Natal perene, sem Papei Noel e sem hipocrisia, um Natal que, de janeiro a dezembro lhes dê o presente maior que é a igualdade, uma igualdade pregada por Cristo e que os fariseus dos nossos tempos não desejam dá-la.
Que 2015 seja menos perverso e que em todos nós Jesus renasça todos os dias; que todas as nossas crianças, ricas ou pobres, encontrem a felicidade que procuram, sem que para tanto tenhamos que ouvir o incômodo ró-ró-ró, dessa figura abjeta que a mídia inventou para que os ricos possam ser mais ricos e os pobres cada vez mais pobres.
Desejo a todos, mil felicidades.