(Folha neste sábado)
Acuado pela acusação de que recebeu US$ 5 milhões de propina do petrolão, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), elevou a temperatura da crise política ao anunciar seu rompimento com o governo Dilma Rousseff e começar a tomar medidas de retaliação contra a presidente.
Desafeto do governo desde que chegou à presidência da Câmara, no início do ano, Cunha acusa os petistas de incentivar as investigações sobre as suspeitas de que foi beneficiado pelo esquema de corrupção na Petrobras, revelado pela Operação Lava Jato.
Mas o deputado chegou ao fim da sexta-feira (17) sem receber o apoio do próprio partido à decisão de romper com o governo, e com aliados temendo que ele fique isolado –apenas com seu grupo mais fiel– na trincheira que abriu contra o governo Dilma.
O peemedebista começou o dia cumprindo as ameaças feitas na véspera, quando foi divulgada a informação de que o lobista Julio Camargo afirmou ter pago a ele propina de US$ 5 milhões por contratos feitos com a Petrobras.
“Estou oficialmente rompido com o governo a partir de hoje. Teremos a seriedade que o cargo ocupa. Porém, o presidente da Câmara é oposição ao governo”, afirmou em entrevista às 11h de sexta, último dia antes do recesso do Congresso, que só voltará ao trabalho em agosto.
Cunha disse que sua posição não o levará a patrocinar o “fim da governabilidade”. Nos bastidores, ele indicou que pretende criar desconforto para a presidente, mandando organizar e atualizar os vários pedidos de impeachment de Dilma apresentados à Câmara neste ano.
Minutos depois da entrevista de Cunha, o PMDB veio a público dizer que continuará apoiando o governo. Principal aliado dos petistas no Congresso, o partido afirmou por meio de nota que a escolha do deputado é “a expressão de uma posição pessoal, que se respeita pela tradição democrática do PMDB”.
A nota do partido enfatizou que a decisão de deixar a base governista só poderia ser tomada “após consulta às instâncias decisórias do partido: comissão executiva nacional, conselho político e diretório nacional”.
Eduardo Cunha sabia que não teria a companhia da cúpula do seu partido ao abandonar o barco governista. Na noite de quinta (16), ele foi ao encontro do vice-presidente Michel Temer, principal articulador político do governo e presidente do PMDB, na base aérea de Brasília, onde ele embarcaria para São Paulo.
Acompanhado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), Cunha foi logo propondo a Temer que o PMDB fosse para a oposição. A seu estilo, o vice-presidente pediu calma ao deputado e disse que essa era uma decisão que não podia ser tomada de forma isolada por eles.
Presente ao encontro de quinta-feira, Renan preferiu não endossar o tom bélico de seu colega nesta sexta e desmarcou entrevista que convocara para fazer um balanço das atividades do semestre.
Em conversas reservadas, Renan, que tem imposto seguidas derrotas ao governo no Senado, confidenciou que prefere manter-se em silêncio temporariamente.
Principal alvo da ira de Cunha, que acusou o Planalto de abrigar um “bando de aloprados”, o governo Dilma começou o dia sabendo da opção pelo rompimento do peemedebista e baixando ordem para que ninguém respondesse às provocações de Cunha.
Em nota divulgada no início da tarde, o Planalto disse esperar que a posição de Cunha “não se reflita nas decisões e nas ações” da presidência da Câmara, que “devem ser pautadas pela imparcialidade e pela impessoalidade”.
Indiferente ao apelo do Planalto, Cunha autorizou na tarde de sexta a criação de duas CPIs que podem criar constrangimento para o governo, com a missão de investigar o BNDES e os fundos de pensão das empresas estatais. Elas devem começar a funcionar em agosto.