(Editorial da Folha na segunda-feira)
No mundo de Eduardo Cunha, CPI que investiga escândalo da Petrobras procura defender suspeitos e tenta atacar acusadores
Na CPI da Petrobras, vigora “a moral da gangue”; entre os deputados encarregados de examinar o escândalo predomina um espírito de “vingança, intimidação e corrupção”. Quer-se, enfim, abafar e desmoralizar a investigação.
Não é a menor ironia, em meio a todo o escândalo de corrupção na Petrobras, que fraseologia tão contundente tenha partido não de um membro do Ministério Público ou da Polícia Federal, e sim dos advogados de um lobista –alguém acusado de se dedicar ao acerto de propinas e ao trato com participantes de um esquema criminoso.
Pior: embora provenha dos defensores de um lobista confesso, o tom moralizante e indignado dessa avaliação sem dúvida se justifica.
Há razões para supor que partem do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), pressões consistentes no sentido de evitar que se dê crédito a depoimentos capazes de envolvê-lo nas irregularidades desveladas.
Inicialmente, o lobista Julio Camargo preservara o deputado de qualquer acusação nos depoimentos que prestava, dentro de um acordo de delação premiada.
Muda, entretanto, o seu testemunho. Conta que Cunha exigira, por intermédio de um operador do PMDB, a soma de US$ 5 milhões como recompensa por aquisições de navios pela Petrobras.
Feita a nova acusação, eis que ocorre uma reviravolta. A então defensora de Camargo, Beatriz Catta Preta, abandona o caso.
Na quinta (30), a advogada concedeu entrevista ao “Jornal Nacional”. Insinuações gravíssimas, mas às quais faltaram maior concretude, entreteceram seu discurso.
Sem citar Cunha, disse ter sofrido ameaças e intimidações por parte de aliados do peemedebista. Semanas atrás, o doleiro Alberto Youssef afirmara algo semelhante diante do juiz federal Sergio Moro.
Provieram do deputado Celso Pansera, do mesmo PMDB fluminense, requerimentos para quebrar sigilo bancário, fiscal e telefônico da ex-mulher e de duas filhas de Youssef. Quanto a Catta Preta, o parlamentar a convocava para comparecer à CPI. Caso prosperasse, a iniciativa de Pansera constituiria verdadeira aberração. Nunca, nos quadros de uma CPI, ter-se-á tentado desqualificar uma denúncia investigando o advogado do delator. A comissão passa a defender os suspeitos e a atacar os acusadores.
O direito ao sigilo profissional de Beatriz Catta Preta foi garantido por Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal. “É inadmissível”, disse o ministro, “que autoridades com poderes investigativos desbordem de suas atribuições para transformar defensores em investigados.”
Ao que parece, no mundo de Eduardo Cunha e dos que o sustentam na CPI, essa lição ainda está por ser aprendida.