Recaída

By | 23/08/2015 9:57 am

[Editorial da Folha, neste domingo]

Dilma repete intervenções que, a seu ver, podem dar um norte virtuoso ao mercado, mas que se provaram danosas em seu 1º mandato

Os bancos públicos pretendem outra vez remediar o que julgam ser as dificuldades especiais de alguns setores econômicos, em tese prejudicados de modo particularmente duro pelo quadro recessivo.

A presidente Dilma Rousseff (PT), em outras palavras, reincide nas intervenções que, a seu ver, têm o poder de dar um norte virtuoso ao funcionamento do mercado.

A iniciativa, desta feita, não deve resultar nos descalabros do primeiro mandato da petista –em particular nas contas do governo, na indústria do petróleo e no setor elétrico. Ainda assim, as medidas causam mais descrença quanto à disposição e à capacidade do Executivo de lidar com os motivos fundamentais da crise.

Em termos estritamente econômicos, é difícil ver sentido na ação concertada da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil.

No que diz respeito à política econômica, o plano cobre com ainda mais descrédito a tentativa de enfrentar problemas de fundo. Acrescenta novo ingrediente a um caldeirão repleto de incertezas como o histórico da presidente, a atuação do PT e a irresponsabilidade do Congresso diante do necessário ajuste das contas públicas.

Em termos gerais, a iniciativa parece eivada de casuísmos, pois o governo agracia parte do mundo empresarial que lhe granjeou algum apoio político indireto e procura estimular novas adesões.

Grosso modo, os bancos passam a oferecer empréstimos para financiar as demandas mais prementes de fornecedores de bens e serviços das indústrias fabricantes de veículos automotores em geral. Fez-se um arranjo pelo qual os pagamentos das montadoras servem de garantia ao crédito estatal.

Falta crédito, de fato. O Banco do Brasil enfatiza que não haverá subsídios em seus empréstimos. No caso da Caixa, haverá recurso a fundos públicos e taxas subsidiadas –desde que, ao menos em tese, satisfeitos requisitos como a manutenção do nível de emprego nas empresas agraciadas.

O governo, além disso, afirma que outros setores (cooperativas agrícolas, petróleo e gás, construção civil) serão beneficiados por programas semelhantes.

Do ponto de vista macroeconômico, o plano parece no mínimo incoerente. A política que tem sido implementada é de redução de consumo público e privado, manifesta nos cortes das despesas do governo e na contenção do crédito.

Importa, ademais, fazer perguntas incômodas para o Planalto.

Em que se baseia a escolha deste ou daquele setor? Qual o dom do poder público de acertar escolhas de direcionamento de capital, ainda mais considerado o péssimo retrospecto das intervenções deste governo? Qual será o efeito desses empréstimos na rentabilidade dos bancos públicos e, portanto, no caixa da União e dos fundos que vão alimentar a iniciativa?

O programa condiciona, em certos casos, empréstimos especiais, mais baratos, à manutenção de emprego. Difícil acreditar que o Planalto tenha capacidade ou disposição política de verificar o cumprimento de tal cláusula.

No caso de infrações, fica-se a imaginar de que maneira o contrato será denunciado. Por fim, é discutível que a manutenção do emprego em setores escolhidos a dedo seja a solução mais eficiente para a economia como um todo –talvez houvesse melhores resultados se o dinheiro se dirigisse a negócios mais promissores e rentáveis.

Mais importante, porém, é o que ações dessa espécie revelam sobre a incapacidade do governo de apresentar planos de alcance maior.

Esta Folha tem reiterado desde o início do ano que apenas medidas emergenciais de contenção do endividamento público –o chamado ajuste fiscal– não bastariam nem mesmo para limitar a gravidade da recessão, menos ainda para facilitar a retomada duradoura de algum crescimento mais adiante.

Ocorre que, para piorar, nem sequer o ajuste emergencial funciona a contento, pois o governo federal deve ter outro deficit primário (despesas maiores que as receitas, excluído o gasto com juros).

Portanto, além de refazer um plano imediato de contenção de gastos e aumento de receitas, o governo ainda precisa apresentar o restante desse programa: ações que sinalizem a volta aos trilhos após a estagnação.

Afora evitar o descontrole das contas, tal plano de médio prazo pode abreviar e atenuar a recessão.

Trata-se do tão conhecido projeto de limitar o crescimento da despesa regular do Estado ao aumento do PIB per capita, no máximo; de simplificar impostos e regras sobre investimento e produção; de reduzir regulamentação do trabalho; de dar cabo pelo menos das normas que aumentaram custos e dívidas de setores cruciais, como petrolífero e elétrico.

Compare-se, porém, tal programa com as ruminações e reincidências no vício do presente governo. De um lado, planos para o país; de outro, remendos casuísticos.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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