(Vinicius Torres Freire, colunista da Folha)
Em cerca de 15 dias, Lula evitou o desmoronamento final de Dilma Rousseff. Tornou-se um regente provisório, cargo informal no qual pode durar dias, não se sabe, dadas as intermitências do coração da presidente, para dar um nome proustiano às inconstâncias dilmianas.
Parece novidade. Enquanto durar.
Faz duas semanas, Lula negocia de modo frenético um modo de esfriar a chapa do impeachment e de embananar a Lava Jato. Ao menos, parece ter conseguido dobrar Dilma Rousseff a render-se a grossas obviedades da política politiqueira.
A presidente já bebia água do terceiro volume morto do PMDB, mas foi Lula que abriu as torneiras de modo a matar sedes variadas do partido e, de quebra, dar uma regada no PDT e até no PSB.
Assim talvez pelo menos se adie o impeachment e se leve apoio no Congresso a fim de catar dinheiros para remendar o buraco nas contas do governo. No caso de a abdicação branca de Dilma Rousseff ser mais completa, se especula se Lula arranjaria algum plano mais ambicioso (menos medíocre e derrotado) de colocar ordem na economia (evitar novos desastres no curto prazo).
Quanto ao impeachment, o calendário do drama ainda está mantido. Ou seja, o TCU deve votar na semana que vem se acusa Dilma de crime fiscal. A oposição pretende desencadear testes da votação do impeachment no final de outubro. A festa do adeus (ao governo) do PMDB ainda está marcada para novembro.
Os empecilhos eram ainda ontem os mesmos. Isto é: 1) Elites do dinheiro muito divididas sobre a conveniência política, econômica e democrática de jogar o país no conflito do impeachment; 2) PSDB dividido; 3) PMDB dividido.
O PMDB pode desfazer o circo do impeachment. Tem até bancada no TCU, ministros vinculados à sigla.
Suponha-se que o PMDB pelo menos adie o início do show. Como fica, por exemplo, o remendo fiscal? Passam a CPMF, a apropriação do dinheiro do Sistema “S”, o corte do reajuste dos servidores e o confisco das emendas parlamentares, que perfazem 80% do pacote? Ontem, ainda parecia difícil.
Sem tal dinheiro, que em si não resolve grande coisa, o caldo entorna um tanto mais. Mais ainda: o déficit vai ser bem maior que o previsto até “no mercado”. Sem tal remendo, há risco renovado de faniquitos como o da semana passada, altas de juro, rebaixamento formal de crédito do governo etc., a bola de neve que engorda desde julho. Em suma, isso dá em recessão maior e mais profunda.
Não precisa ser assim. Seria até possível salvar 2016 se por um milagre aparecesse um plano de mudança econômica.
Mas nem a paz com o PMDB é certa. Na quarta, Michel Temer se reuniu com a bancada do impeachment. É difícil saber de Eduardo Cunha, sangrando mortalmente no Petrolão. Apesar dos ataques, a Lava Jato está muito operante. A tensão no “mercado” ainda é brutal. A Petrobras, com reajuste e empréstimo do BB, tem um pé na cova.
Lula, reunido na quarta com o PT, tentava animar torcidas dizendo que quer a turma na rua e crédito do BNDES para empresas. Além de jogar para suas galeras e além da política politiqueira, tentaria articular algum plano de recuperação econômica sério? Combinou com Dilma Rousseff? E o povo bestificado e esfolado na recessão?