(Trecho do livro O Nome de Deus é Misericórdia, com idéias do Papa Francisco, lançado na terça-feira, 12 de janeiro)
“A corrupção é o pecado que, em vez de ser reconhecido como tal e de nos tornar humildes, se tornou sistema, (…), uma forma de vida. Não sentimos necessidade de perdão e de misericórdia, mas justificamo-nos e aos nossos comportamentos.
Jesus diz aos seus discípulos: ‘Se alguém te ofender sete vezes ao dia e sete vezes vier te dizer ‘Arrependo-me’, perdoa-lhe’. O pecador arrependido, que depois cai e recai no pecado por motivo da sua fraqueza, encontra novamente perdão quando reconhece que necessita de misericórdia. O corrupto, por sua vez, é aquele que peca e não se arrepende, peca e finge ser cristão, e com a sua dupla vida provoca escândalo.”
“O corrupto não conhece a humildade, não sente necessidade de ajuda, leva uma dupla vida. Em 1991, dediquei a este tema um longo artigo, publicado num pequeno livro, ‘Corrupção e Pecado’.
Não é preciso aceitar o estado de corrupção como se fosse apenas mais um pecado. Embora muitas vezes se identifique a corrupção com o pecado, na realidade trata-se de duas realidades diferentes, apesar de interligadas.
O pecado, sobretudo se reiterado, pode levar à corrupção, mas não quantitativamente –no sentido de que um determinado número de pecados não fazem um corrupto–, quando muito qualitativamente: criam-se hábitos que limitam a capacidade de amar e levam à autossuficiência. O corrupto cansa-se de pedir perdão e acaba por acreditar que não deve pedir mais.”
“Não nos transformamos de repente em corruptos; existe um longo caminho de declínio, para o qual se desliza e que não se identifica simplesmente com uma série de pecados.
Uma pessoa pode ser uma grande pecadora e no entanto pode não ter caído na corrupção. Aludindo ao Evangelho, penso no exemplo das figuras de Zaqueu, de são Mateus, da samaritana, de Nicodemo, do bom ladrão: nos seus corações, pecadores todos, tinham alguma coisa que os salvava da corrupção. Estavam abertos ao perdão (…), e foi essa abertura que permitiu que a força de Deus entrasse.
Ao reconhecer-se como tal, o pecador de alguma forma admite que aquilo a que aderiu, ou adere, é falso. Por sua vez, o corrupto esconde aquilo que considera o seu verdadeiro tesouro, aquilo que o torna escravo, e disfarça o seu vício com a boa educação, arranjando sempre uma forma de salvar as aparências.”