(editorial da Folha)
Caso seja aprovada, a proposta que limita a expansão dos gastos públicos no Brasil representará a primeira grande inflexão na trajetória da despesa estatal desde a Constituição de 1988.
A mudança é necessária porque ao crescimento da máquina pública sempre corresponde aumento da carga tributária ou contração de dívidas —isso quando não ocorrem as duas coisas.
De 1997 a 2015, a despesa federal avançou 6,2% ao ano acima da inflação, no que foi acompanhada de mordidas cada vez maiores no bolso do contribuinte.
No agregado dos três níveis de governo, ambas (despesas e carga) subiram cerca de seis pontos percentuais do PIB no período e hoje correspondem a um terço da economia —fatia bem superior à de países em desenvolvimento.
A dívida pública, por sua vez, não só atingiu patamar muito alto para o nível de renda do Brasil como está em trajetória explosiva. Saiu de 51,7% do PIB em 2013 para 70,1% em agosto deste ano; estima-se que, mantido o ritmo atual, passará de 90% até 2020.
A fim de conter a voracidade do Estado e controlar a dívida, o governo de Michel Temer (PMDB) propõe que os gastos públicos sejam congelados, sofrendo correções apenas pela inflação por até 20 anos. Ou seja, nesse período, em tese nenhum governo precisará recorrer a novas altas de impostos (mas são necessárias reformas para tornar a tributação mais justa).
Em contrapartida, dado que o bolo total se tornará inelástico, qualquer alteração no volume de uma despesa (por exemplo, salário de servidores) implicará redução de outra (como investimento). Daí surgiram as preocupações com setores fundamentais para a maioria da população: saúde e educação.
Pelas normas atuais, essas rubricas são vinculadas a um percentual da receita: aumentam quando a economia vai bem, mas despencam se há queda na arrecadação.
O novo regime, ao contrário do que sugerem seus críticos, protegerá a saúde e a educação e tornará essas despesas mais previsíveis. Haverá um piso para desembolsos nessas áreas, não um teto. O Congresso poderá aumentá-los se quiser, desde que sejam compensados pela redução de outros gastos.
Para que as novas regras funcionem, entretanto, é essencial reformar a Previdência, que já absorve metade dos recursos da União e cresce 4% ao ano acima da inflação. Sem mudanças, a expansão do deficit previdenciário achatará as demais rubricas.
Se, como se espera, o país voltar a crescer de forma sustentável, é provável que o enxugamento da máquina pública se prove excessivo antes de 20 anos –nesse caso, o problema poderá facilmente ser resolvido pelo Congresso.
O importante é que, agora, se estabeleçam as condições não só para a retomada da confiança na economia brasileira, com equilíbrio das contas públicas, mas também para um avanço no debate acerca de prioridades orçamentárias e eficiência do gasto estatal.