PPP ou PQP?

By | 23/04/2017 8:40 am

 

(Ruth de Aquino, colunista da revista Época)

A megaconspiração entre empreiteiros e políticos no Brasil conseguiu desmoralizar a Parceria Público-­Privada. A PPP seria excelente instrumento para melhorar a vida de centenas de milhões de pessoas. Em infraestrutura, transporte, metrôs, estradas, portos, aeroportos, moradia, saneamento, escolas, hospitais, urbanização de favelas. Que desperdício. Tudo contaminado pela ganância e pela falta de caráter de “serial-robbers” no Poder.

Graças à Operação Lava Jato – que a classe política tenta torpedear com o projeto “contra abuso de autoridade” –, temos acesso às entranhas desse polvo em que se transformou a PPP. As propinas eram distribuídas em motéis e flats e mesmo na casa da mãe idosa, ou pagos no exterior ou em mesadas em espécie. Diante disso, pensamos: PQP! Emergem detalhes constrangedores e montantes estapafúrdios guardados até em meia-calça feminina por baixo do terno. “A gente entregou um ‘recurso’, a pessoa baixou a calça e botou dentro da meia”, revelou o delator Carlos Cunha, em processo que apura corrupção na reforma do aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro.

A cada delação, casos picantes são relatados em minúcias. Assim ficamos sabendo que somente a Odebrecht teria pago 36 parcelas de mesadas de R$ 547 mil ao ex-deputado Eduardo Cunha, por sua “ajuda política” para o Porto Maravilha, no Rio de Janeiro. A ajuda de Cunha era cobiçada por sua influência na Caixa Econômica Federal, que contribuiu para a obra com R$ 3,5 bilhões do FGTS. No total, Cunha teria recebido R$ 52 milhões por essa PPP, prevista para durar 15 anos. Apelidado de Caranguejo na planilha, ele diz que a delação é “falsa, fluida e desprovida de provas”. Fluida?

Impressiona que as delações dos executivos da Ode­brecht – um roteiro de endereços, valores, métodos de distribuição, nomes de intermediários, descrições de acobertamento – sejam todas tachadas de “falsas” pelos acusados. Se assim fosse, Emílio e Marcelo mereceriam um Oscar de ficção. E os figurantes também. Cada dia a propina era paga num endereço diferente. Para proteger os executivos de…assalto! Um dos delatores comprou um cofre “desses de caminhão” e instalou na sala de seu apartamento.

Ficamos sabendo que Sérgio Cabral, agora réu pela sétima vez, distribuía obras entre as empreiteiras antes mesmo das licitações e que teria recebido mais de R$ 700 milhões de propina pelas obras do Maracanã e pelo PAC das favelas. Imagine um governador roubar dos favelados, desviar milhões do teleférico do Complexo do Alemão. É preciso diagnosticar o transtorno que acometeu Cabral. Muitas negociações aconteciam no Palácio mesmo. Ele falará?

São Paulo também contribuiu ativamente para desmoralizar as PPPs. As obras da Linha 6 do metrô de São Paulo, que teriam 15 estações, estão paradas. Dá para entender. Do contrato de R$ 9 bilhões assinado pela Odebrecht, saíram, segundo delações, propinas vultosas para a campanha do governador Geraldo Alckmin. Também saiu dos custos do metrô um “programa de ajuda” de R$ 14 milhões para o ex-prefeito Gilberto Kassab. Como ministro das Cidades de Dilma Rousseff, Kassab teria tentado retribuir com benefício fiscal para a Odebrecht.

Contra Lula, o cerco aperta. No caso do ex-presidente, não são as somas que mais impressionam, por enquanto. Mas, ainda segundo as delações, a atração pelos favores pessoais, como a obra de R$ 700 mil no sítio de Atibaia, pedida por ele ao amigo Odebrecht, coordenada por Dona Marisa e disfarçada por um contrato fictício em valor mais baixo e em nome de Fernando Bittar, o sócio do filho. Quem negaria um favor a Lula? Ou ao “assessor para assuntos pessoais do presidente”, Rogério Aurélio Pimentel? Afinal, como disse o delator, a obra custaria algo, “digamos, dentro do nada, nenhum valor absurdo”.

Lula também pediu à Odebrecht, em troca de favores, ajuda a regimes autoritários. Alguns empreendimentos no exterior eram comandados por seu sobrinho Taiguara dos Santos. E assim Lula ajudou a Cuba dos irmãos Castro, a Venezuela de Chávez e Maduro e a Angola de José Eduardo dos Santos. Este último governa Angola desde 1979 e também é comandante em chefe das Forças Armadas. Um dos países mais corruptos que visitei, na época da guerra com a África do Sul.

São 267 acusados de crimes contra nosso dinheiro. São mais de 900 horas de gravações. Guarde o nojo, o cansaço com as repetições dos episódios, o descrédito alimentado pelo sigilo e pela impunidade ao longo de décadas. Podemos estar testemunhando o expurgo da bandidagem, o confisco de bens e a volta de bilhões para os cofres públicos. O desfecho da série pode ser escrito também por nós. Vamos limar o projeto oportunista contra abuso de autoridade e ajudar a acabar com o foro privilegiado.

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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