(Marcos Augusto Gonçalves, colunista da Folha)
Boa ou ruim, a segunda denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o presidente Michel Temer será rejeitada pela Câmara. Preocupada em escapar do camburão, a ralé moral que domina o Congresso, com o aval do voto distraído e inconsequente de grande parte do eleitorado, deverá selar a continuidade da camarilha corrupta do PMDB no poder.
Contará para isso com o apoio de alguns medalhões políticos, a complacência de setores da opinião pública e o endosso, já não muito entusiasmado, do Partido da Economia.
A um ano das eleições, num quadro em que já não se vê alternativa de curto prazo menos tenebrosa, Temer promoverá mais uma rodada de distribuição de carniça às hienas do baixo clero parlamentar para assegurar sua sobrevivência.
Uma delação, por ora improvável, de Geddel Vieira Lima, talvez criasse alguma consternação, mas ainda assim seria arriscado apostar no afastamento. Talvez um vídeo imaginário em que o vice sorrateiro surgisse ao lado de Caju, Angorá e Primo, munido de um estetoscópio, para abrir com seus dedos bailarinos o cofre da Reserva Federal, pudesse abalar seu reinado –mas isso é apenas uma piada de leitor de gibi, que às vezes pensa estar vivendo na Gotham City do Pinguim, do Charada e do Coringa.
Presidente biônico, espécie de mesóclise política que liga a direita “liberal” à patrimonialista, Temer ainda acena com a cenoura da reforma previdenciária no intuito de não perder seus patrocinadores.
Será difícil aprová-la, e é bom que seja assim. Não por desnecessária, mas por ser melhor que entre em pauta pelas mãos de um governo eleito –e não urdida em gabinetes como moeda de troca para planos de fuga.
Temer tem a pior aprovação de um presidente da República; é o único denunciado no cargo por corrupção; seu governo acaba de produzir o maior deficit público da história; suas negociatas fomentam privilégios e queimam dinheiro do contribuinte; e sua pinguela para o passado nos leva a retrocessos civilizacionais sinistros.
Sim, o mordomo votou o teto de gastos (que a essa altura vai se revelando uma carroça problemática à frente dos bois) e serviu alguns canapés para o mercado.
Mas ao contrário do que vendia o pensamento mágico “liberal” às vésperas do impeachment (quando trombeteava o milagre das expectativas e um crescimento que iria logo se aproximar dos 4%), presenciamos uma previsível, incipiente e tímida virada do ciclo econômico, que um comentarista teleguiado chamou outro dia de “recuperação sólida” –apesar da falta de investimentos, da situação fiscal dramática e da expectativa de uma expansão estatística na casa do zero vírgula qualquer coisa.
Comentário do programa – Segundo Josias de Sousa, colunista da Folha, já estaria engatilhada a liberação de um bilhão de reais em verbas públicas, para garantir mais uma votação favorável a Michel Temer para enfrentar a segunda denúncia do Procurador Geral da República. (LGLM)