Em uma carta, o ex-ministro pediu para sair do PT. Não aguentou a desfaçatez dos correligionários que agora cobram dele retidão ética e moral
FLÁVIA TAVARES E LEANDRO LOYOLA, na revista época desta semana
O remetente: Antonio Palocci Filho, ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil, ex-BFF (ex-melhor amigo para sempre) de Luiz Inácio Lula da Silva. O destinatário: Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores, aos cuidados de sua presidente, a senadora Gleisi Hoffmann. No cabeçalho: Curitiba, 26 de setembro de 2017. Palocci veio por meio desta se desligar do partido que fundou em Ribeirão Preto, interior de São Paulo. O ex-ministro escreveu a carta em que pede sua desfiliação do PT no exato dia em que completava um ano preso. Recorreu à cursiva. Entregou um manuscrito a sua equipe de advogados, que se debateu para traduzir a letra de médico do ex-ministro. No fim, a equipe optou por divulgar a missiva na frieza de letras digitadas. Palocci esquematizou em sete itens o que tinha a dizer em sua defesa e em outros três suas conclusões. Escancarou erros do partido, maquiou de patriotismo suas razões para dizer a verdade à Justiça e, pecado-mor, desafiou o magnânimo guia petista e a “seita” criada por ele. Finalizou com um gélido “Saudações cordiais”, como é de sua personalidade. Com caneta azul, Palocci inscreveu sua assinatura curva na versão digitalizada dos advogados. Estava selada a separação daquele que foi um dos homens mais poderosos da República e do partido que ele ajudou, lícita e ilicitamente, a robustecer.
Antes que o PT rompesse com ele, Palocci decidiu romper com o PT. A briga começara 20 dias antes, quando Palocci se sentou diante do juiz Sergio Moro e desatou a contar parte do que conhece do maquinário petista. Narrou o “pacto de sangue” de Lula com a família Odebrecht: o ex-presidente trabalhava para dar à empreiteira contratos bilionários no Brasil e no exterior e, em troca, recebia rios de dinheiro para as campanhas petistas e em propina disfarçada de imóveis e de contratação de palestras. O depoimento foi o adultério de Palocci. O PT partiu para o litígio. O diretório em Ribeirão Preto abriu um processo na Comissão de Ética para expulsar Palocci. O diretório nacional determinou sua suspensão por 60 dias. Lula desancava o ex-companheiro nas internas. Enquanto era xingado apenas por Lula, Palocci aguentou calado. Ele perdeu a paciência mesmo quando soube que o PT iniciara seu processo de expulsão. Justo o PT, para o qual ele conseguiu tanto dinheiro. Esse PT, justo o PT, que deve a ele grande parte do sucesso do primeiro governo Lula, decidira expulsar Palocci por (falso) moralismo. Era demais.
Mas a coisa só desandou na cartinha porque o processo de expulsão veio do PT sob a direção da senadora Gleisi Hoffmann, uma das pessoas que Palocci mais despreza. Gleisi sucedeu a Palocci na Casa Civil da então presidente Dilma Rousseff, em junho de 2011. Acusado de enriquecimento ilícito por prestar consultorias enquanto era deputado federal (seu patrimônio no período cresceu 20 vezes), Palocci deixou o cargo sem resistência de Dilma. Foi a primeira vez que o ex-presidente Lula se enfureceu com a pupila. O líder esperava que Dilma protegesse Palocci, escolhido para vigiá-la ainda durante a campanha eleitoral. Gleisi estava prontinha para assumir a Pasta – Palocci acha que ela conspirou por sua queda. No Congresso, os petistas ficaram desaforados: “O cara ficou esse tempo todo juntando dinheiro para si mesmo e nós com tudo isso de dívida de campanha?”. “Vocês sabem que procurei ajudar no projeto do PT e do presidente Lula em todos os momentos”, diz Palocci na carta. Sim, o PT sabe. Por anos, Palocci foi o caminho ao dinheiro nos momentos difíceis. “Quando a coisa aperta, você liga para o Palocci. Ele dá uns telefonemas e os caras ajudam”, dizia Edinho Silva, ex-tesoureiro da campanha de Dilma em 2010, ex-ministro dela, hoje prefeito de Araraquara, interior de São Paulo, ele também enrolado na Lava Jato. Entende-se a indignação do ex-ministro ao ser pressionado agora sobre sua conduta ética e moral.
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http://epoca.globo.com/politica/noticia/2017/09/o-ex-companheiro-antonio-palocci.html