(Hélio Schwartsman, É bacharel em filosofia e jornalista. Na Folha, ocupou diferentes funções. É articulista e colunista)
O brutal assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) coloca em risco a democracia brasileira?
Sim, a democracia é, com o perdão da metáfora brega e surrada, uma flor frágil e bela que tem de ser cultivada sempre. Mas, convenha-se, isso não passa de um truísmo. Nada no mundo, muito menos um regime político, pode ser dado como garantido. Tudo o que interessa manter exige ações com vistas à sua preservação.
A pergunta a fazer, então, é se o homicídio de Marielle representa uma ameaça premente à democracia, isto é, num sentido que vá além da preocupação geral que devemos ter em relação a todas as instituições que desejamos conservar. E aqui eu penso que a resposta é negativa.
O assassinato é, obviamente, escandaloso e revelador do estado falimentar a que chegou a segurança pública no país, em particular no Rio de Janeiro. O fato de que pode haver policiais envolvidos na morte só piora as coisas. Não creio, contudo, que estejamos hoje mais próximos de uma situação de ruptura institucional do que estávamos há dois dias, há dois anos, ou mesmo em 1988, quando assistimos ao assassinato de Chico Mendes.
A triste verdade é que nossa democracia aprendeu a conviver com a violência, inclusive a violência política, em que poderosos recorrem à eliminação física de lideranças que desafiem seus interesses.
A morte de Marielle é um problema de segurança pública com implicações políticas, mas não uma ameaça à democracia. Precisamos reduzir drasticamente a impunidade, que permite que o assassinato de desafetos seja visto como uma forma racional de solucionar conflitos.
Só conseguiremos isso quando a polícia corrupta e violenta que temos der lugar a uma republicana e inteligente, capaz de elucidar crimes e reunir provas para processar seus executores. E essa, acredito, era uma das bandeiras da vereadora psolista.