Ao misturar tudo, ministros do Supremo Tribunal Federal se lançaram numa armadilha
(Hélio Schwartsman, É bacharel em filosofia e jornalista. Na Folha, ocupou diferentes funções. É articulista e colunista)
O julgamento do habeas corpus de Lula no Supremo Tribunal Federal não foi concluído, mas a confusão está armada —e os principais responsáveis por ela são ministros da própria corte.
O problema de fundo é que misturaram tudo. Deixaram que a discussão sobre o futuro imediato de Lula, que tem forte carga político-partidária, se confundisse com o debate sobre a execução provisória de pena, que deveria ter um caráter abstrato. Com isso, se lançaram numa armadilha. Qualquer que seja a decisão, ela terá um forte sabor de casuísmo, o que sempre contribui para corroer um pouco mais a imagem do Judiciário.
A própria discussão abstrata anda menos abstrata do que deveria. O STF parece incapaz de respeitar sua própria jurisprudência. Não faz dois anos que a corte firmou, em ação com repercussão geral, o entendimento de que penas podem começar a ser cumpridas a partir da condenação em segunda instância e já se desenha um movimento para reverter a decisão. O direito precisa de previsibilidade e estabilidade. Não dá para mudar a jurisprudência como quem troca a roupa de baixo.
Pior, muitos dos ministros que foram voto vencido na ocasião jamais aceitaram a derrota e, ignorando o princípio da colegialidade, continuaram a decidir como se o plenário jamais tivesse se pronunciado sobre a matéria. Essa é, sem dúvida, outra fonte de desgaste para o Judiciário.
Como já disse aqui repetidas vezes, não acho que a cadeia seja uma punição adequada para a maior parte dos presos. Ela é cara e contraproducente. Não apenas não recupera ninguém como ainda fornece mão de obra para organizações criminosas. Mas, se mandar pessoas que não representam perigo físico para a população é ruim, ainda pior é deixar de aplicar a lei e a jurisprudência do próprio STF. Aí, o risco se torna institucional. Vamos ver como o STF resolve essa encrenca no próximo dia 4.