Inversão de calendário reforça papel do Supremo e pode fragilizar narrativa petista
(Bruno Boghossian, aborda temas da política nacional. Jornalista já integrou a equipe do “Painel” e foi repórter de política e economia)
Se nenhum ministro estiver atrasado para pegar um avião, o STF encerrará em 13 dias o julgamento que vai definir se o ex-presidente Lula será preso. O adiamento obrigará o tribunal a se pronunciar depois que o processo estiver encerrado na segunda instância, o que dará ares de “palavra final” à votação da suprema corte e ampliará o peso político dessa decisão.
Em 4 de abril, o STF atuará como árbitro máximo e dará ganho de causa a um dos lados do debate —ao menos no campo simbólico. Se a corte conceder o habeas corpus, Lula ficará livre, fortalecerá seu discurso e ganhará um falso troféu de absolvição.
Caso seja derrotado, as consequências políticas serão igualmente destacadas. Ainda que caibam novos recursos, o ex-presidente poderá ser preso logo após uma decisão da corte mais alta do país.
Em resumo: a inversão do calendário dos julgamentos fará com que o destino de Lula esteja irremediavelmente colado à palavra do STF. Solto, o ex-presidente ergueria a voz para denunciar abusos de instâncias inferiores. Preso, veria reduzida a narrativa de perseguição judicial.
O resultado poderá ter impacto na estratégia do PT de transformar o debate jurídico em trampolim para as próximas eleições. É quase certo que o ex-presidente não disputará um novo mandato, mas o partido gostaria que seu substituto concorresse sob a bandeira da injustiça contra o petista para herdar seus votos.
O plano, porém, pode fracassar. A maioria dos eleitores de Lula considera injusto o processo contra ele, mas apenas um terço desse grupo deixa de escolher outro candidato quando o ex-presidente sai do páreo. Uma pequena fração migra para o petista Jaques Wagner e mais de 60% escolhem nomes de outras siglas.
O eleitor lulista ficará frustrado com o julgamento, mas ainda não parece considerá-lo um ponto central para seu voto. Se o discurso do golpe jurídico perder força, o PT pode ficar para trás na corrida eleitoral.