Não é preciso ser sábio para saber como termina o filme com a extrema direita no poder
(Rodrigo Zeidan, Professor da New York University Shangai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ. Publicado na Folha)
Bolsonaro vai acabar com o Bolsa Família. Pelo menos da forma que existe hoje. Afinal, seus economistas sempre foram contra o programa. Também não vai haver reforma decente da Previdência. Ou alguém acredita que ele vai mudar as regras de militares e policiais?
Numa coisa o candidato de extrema direita está certo: vamos voltar a como éramos 40, 50 anos atrás, com desemprego de dois dígitos, inflação em alta, sem vários direitos sociais e sem liberdade de expressão. Dissolver nossos direitos é sua única proposta crível.
Minha experiência com economistas de esquerda pode ser resumida em: desonestidade intelectual. Contudo, com a elite dos economistas formados no exterior, que se dizem liberais, a minha decepção foi muito maior (observação: claro que há exceções dos dois lados).
Durante os últimos seis meses, muitos “liberais” mudaram. De largada, desconsideravam uma candidatura de extrema direita. Aos poucos, foram construindo uma ideia de que esse candidato é como qualquer outro.
O roteiro foi o mesmo do resto da sociedade. Uma mistura de desilusão com o PT, desejo por reformas e uma alienação da realidade dos brasileiros mais pobres. Para o PT não voltar, valia qualquer argumento, por mais contraditório que fosse.
“Ele disse que encheria seu filho de porrada se fosse gay” era seguido por “não é para levar a sério”. “Bandido bom é bandido morto”? Não leve ao pé da letra. Amor pela ditadura e dizer que a solução era matar o Fernando Henrique Cardoso e mais uns 30 mil? Exagero, era só retórica.
Vão perseguir minorias? Não, o Supremo não deixaria. Mas então por que devemos confiar no plano de campanha que promete mil maravilhas e não faz nenhum sentido? Não, não, o plano de governotemos que analisar friamente, olhando custos e benefícios de cada medida de forma puramente técnica.
O fato é: há seis meses apoiar a extrema direita era coisa de conservadores de quermesse, do tipo que dizem que cotas são ridículas, licença-maternidade deveria acabar, professor é doutrinador comunista (seus economistas são fundadores do Escola Sem Partido), aposentadoria rural é absurdo, discriminação salarial contra mulheres não existe e que ser pobre é escolha.
Hoje, muitos “brilhantes” economistas consideram que o capitão vai promover as reformas tão necessárias para sairmos do buraco. Que um pouco mais de PIB (que não vai vir por causa dele, de qualquer forma) vale a violência contra qualquer brasileiro que não compre ideias fascistas.
O entalhe do símbolo nazista no corpo de uma brasileira foi, na verdade, um corte no coração de uma sociedade na qual o projeto iluminista falhou. Seria hilária se não fosse trágica a estratégia de alguém que sempre pregou violência querendo se desassociar dela.
A ingenuidade de que a extrema direita vai ser a campeã das reformas permeia o ideário da nossa elite. Do meu lado, vou um pouco mais além do que o meu colega e grande economista Samuel Pessôa, que escreveu que votaria nulo ou em Haddad.
Por pior que seja a candidatura petista, é melhor que a barbárie. Vote em Haddad, pelo amor dos brasileiros. Não é preciso ser sábio para saber como termina o filme com a extrema direita no poder. O Brasil morre no final.
Comentário do programa – Não sou adepto do “quanto pior, melhor”, mas “quem ri por último, ri melhor”. (LGLM)