Nos EUA, vice afirma que críticas fazem ‘parte do jogo político’, mas que não se importa com elas
(Marina Dias, de Boston, para a Folha)
Alvo de críticas dos principais aliados de Jair Bolsonaro por adotar uma postura antagônica à do governo, o vice-presidente Hamilton Mourão afirmou que não age em contraponto ao presidente e que sua atuação é complementar à do chefe do Planalto.
“Jamais [estou me colocando como contraponto a Bolsonaro]. Eu sou complementar ao presidente, eu o complemento”, afirmou neste sábado (6), após participar de uma série de reuniões em Boston, nos EUA, durante a Brazil Conference.
Nas últimas semanas, Mourão tem se colocado do outro lado do tabuleiro nas principais polêmicas do governo. Na mais recente, enquanto Bolsonaro e seu ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, insistiam na ideia de que o nazismo foi um movimento de esquerda, Mourão disparou: “De esquerda é o comunismo, não resta nenhuma dúvida”.
Questionado por jornalistas sobre como avaliava o incômodo dos aliados do presidente, Mourão afirmou que as críticas “fazem parte do jogo político”, mas que não se importa com elas.
O vice-presidente está nos EUA para uma série de compromissos entre Boston e Washington.
Como mostrou a Folha, o roteiro incomodou aliados de Bolsonaro, que avaliam os compromissos como reforço da tese de que o vice está tentando se firmar como figura plural e dissonante de Bolsonaro.
Neste sábado, por exemplo, Mourão se reuniu com o ex-ministro de Lula Mangabeira Unger por mais de uma hora. “Falamos sobre a economia do conhecimento, sobre a visão que ele tem do mundo moderno. A produção industrial começa a atingir seu limite e o conhecimento passa a ser algo que vale muito dinheiro”, afirmou o general.
O vice ainda tem um encontro com imigrantes brasileiros em Boston, agenda que incomodou particularmente os auxiliares do presidente.
Quando esteve nos EUA, em março, Bolsonaro e seu filho Eduardo deram declarações polêmicas sobre os brasileiros que vivem fora do país. Eduardo disse que eles eram “uma vergonha”.
Em entrevista à Folha, o ex-estrategista de Donald Trump, Steve Bannon, deu voz às críticas a Mourão e disse que o vice tenta se mostrar preparado para assumir o Planalto caso Bolsonaro não dê certo no comando do governo.
Bannon, que participou da visita de Bolsonaro a Washington no mês passado, diz ser inaceitável um vice-presidente manter uma postura antagônica e sugeriu que ele renuncie e vá para a oposição.
“O vice-presidente está tentando mostrar que está preparado se Bolsonaro falhar. E isso não é aceitável. Não é aceitável por ser alguém do governo. Se quiser fazer isso, Mourão deveria renunciar amanhã de manhã e ir para a oposição”, afirmou o americano.
Na segunda-feira (8), em Washington, Mourão deve se encontrar com o vice-presidente dos EUA, Mike Pence. A agenda na capital americana prevê ainda uma entrevista à CNN, rede bastante crítica a Trump.
Quando esteve nos EUA, Bolsonaro se reuniu apenas com pessoas alinhadas ao pensamento conservador de seu governo e concedeu entrevista à Fox News, simpática à Casa Branca.
Comentário do programa – Os partidários de Bolsonaro se incomodam com o General Mourão porque este se mostra mais equilibrado e preparado do que o presidente. E entendem que se por acaso Bolsonaro cair, haverá alguém pronto para substitui-lo. Afinal, Mourão é um general de quatro estrelas e Bolsonaro não passa de um capitão. (Luiz Gonzaga Lima de Morais)