(Publicado no Patos Online)
Há uns sessenta anos atrás, a maior opção de lazer de Patos era o baixo meretrício, cujo eixo central era a famosa rua Beltrando de Azevedo. Para os íntimos era a “Cajarana”. Ali você podia encontrar estudantes, artistas, comerciantes, médicos, advogados, promotores, juízes, vereadores, prefeitos, deputados e por ai afora. Iam comer, beber, ouvir música, se divertir.
Havia casas famosas, conhecidas pelo nome dos seus donos: a boate de Elpidio, o bar de Valdevino, as casas de Mariazinha, Pitéu, Tatá, Nega Biu, Dalva, Marluce. Algumas delas ainda hoje frequentadas por boêmios da terceira idade, principalmente nas manhãs de domingo. Em Elpídio se apresentaram grandes nomes da música brasileira como Nelson Gonçalves e Altemar Dutra. E havia um elenco de acompanhantes de primeira categoria.
Valdevino era famoso pelo feijão verde com galinha de capoeira. Nas diversas casas encontravam-se acompanhantes de todas as idades e origens, além de boa música e boas palestras.
Claro que em ambiente semelhante havia gente de toda espécie, mas havia muita gente boa. Os mais antigos sabem de casamentos cujas parceiras foram retiradas “da vida” e lá fora foram senhoras de maior respeito, cujas descendências continuam honrando a nossa cidade. Lá mesmo nasceram filhos de deputados, de comerciantes, de médicos e advogados, que não desonraram a sua origem paterna.
Remontando a um período mais remoto lembramos para os mais novos, pois provavelmente não há mais ninguém daquele tempo, que antes da Cajarana no lugar atual, o cabaré de Patos era na rua da Baixa, daí a origem dos seus becos com casas de “porta e janela”. Hoje moradia de tanta gente boa e palco da minha infância.
Este esboço histórico visa situar o ouvinte/leitor na pequena história que vou contar, acontecida em um passado mais recente, há uns trinta anos atrás. Um amigo meu solteirão, já falecido, era frequentador assíduo de um dos prostíbulos da nossa “cajarana”, preferido por pessoas de mais idade, pois a “madame” sabia ajeitar os idosos.
Meu amigo, era auxiliar de serviços gerais no Banco do Brasil, e certo dia, com o dinheiro do salário mensal no bolso, foi “tirar o atrasado”. Na animação, se excedeu um pouco na bebida e terminou adormecendo debruçado em uma das mesas do “ambiente”. Na hora de fechar, a dona do prostíbulo o acordou e ele se dirigiu para casa para curtir a ressaca e se preparar para novo dia de trabalho. De manhã, ao vestir as calças, sentiu falta da carteira. Procurou por toda parte e não a encontrando lembrou-se da “carraspana” da véspera e resolveu ir ao baixo meretrício para ver se tinha notícia da sua carteira e do que restava do dinheiro do seu pagamento.
Procurou a dona da casa onde estivera na véspera e contou a história dizendo que desconfiava que tinha sido roubado ali, depois que se embriagara. A “dona” perguntou-lhe quanto tinha na carteira e ele disse o valor aproximado pois se lembrava quanto gastara até se embebedar.
A mulher entrou na “camarinha” e saiu de lá com carteira dele e explicou. “Vi que você estava embriagado e quando adormeceu, observei alguns “malandros” arrodeando a mesa. Tirei sua carteira do bolso e guardei. Conte para ver se o dinheiro está completo”. Meu amigo pulou de alegria. Ainda tinha gente decente, mesmo naquele ambiente.
Meu pai, que depois de viúvo, vez por outra, passava pelo local, foi quem me contou esta história de que me lembrei, por conta de um episódio divulgado esta semana nas redes sociais e em sites locais. Um determinado cidadão que se diz pré-candidato a vereador teria afirmado que a Câmara de Vereadores atual era um verdadeiro prostíbulo.
Durante esta semana eu me encontrei com uma velha amiga daqueles tempos e ela fez o seguinte comentário: “Fulano cometeu uma injustiça com os vereadores e com as raparigas. Ainda tem vereador decente, assim como foi o pai dele. Mas ainda hoje tem também rapariga decente”.
Diante da afirmativa dela me lembrei daquele episódio de trinta anos atrás. Realmente, não se pode generalizar. Por sinal, aquela “madame” ainda é viva já “beirando” os noventa anos. Assim também como Tatá e Nega Biu, que ainda reúnem os amigos nos finais de semana, servindo uma cerveja gelada, um tira-gosto de primeira e uma boa música da época. (LGLM)
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