A pena original (veja também o nosso comentário)

By | 24/11/2019 7:28 am

 

O corrupto precisa perder o patrimônio que já possuía antes de meter-se na aventura

(Hélio Schwartsman, colunista da Folha)

 

Como estou até agora recebendo e-mails irados por ter defendido na coluna do dia 19/11 que corruptos não deveriam ir para a cadeia, creio que vale desenvolver um pouco mais a argumentação.

 

Um bom lugar para começar é a função da pena. Estou ciente de que a maioria da humanidade é retributivista, isto é, acha que quem provoca algum mal à sociedade merece receber um castigo por isso. É difícil fundamentar esse raciocínio sem recorrer a abstrações metafísicas como Deus ou a ideia de justiça.

 

Como não gosto muito de religiões, um caminho que me parece mais sólido para justificar a pena é sua dimensão preventiva. Impomos sanções ao criminoso tanto para impedi-lo de seguir com o comportamento delituoso como para, pelo exemplo, convencer outros agentes de que imitá-lo não é uma boa ideia.

 

E o que leva alguém a delinquir? No modelo clássico formulado pelo Nobel em Economia Gary Becker, três fatores influem na decisão de cometer ou não um crime: benefício esperado, probabilidade de ser apanhado e pena cabível. Se o primeiro item é elevado e o segundo muito baixo, você pode estabelecer até a prisão perpétua como sanção que, ainda assim, muitos considerarão que vale arriscar.

 

Para fazer com que o crime de fato não compense, precisamos mudar o termo do meio da equação, isto é, aumentar substancialmente a probabilidade de que o corrupto seja detectado, processado e condenado, hipótese em que as penas impostas já não precisam ser cruéis e nem mesmo elevadas.

 

E qual seria uma pena adequada? A meu ver, ela deve ser pecuniária, mas precisa ir bem além da simples devolução do dinheiro roubado. O corrupto precisa perder o patrimônio que já possuía antes de meter-se na aventura e passaria a trabalhar duro e suar o rosto para sobreviver. Retributivistas irredutíveis podem encontrar consolo no fato de que essa é a mesma pena que Deus impôs a Adão pelo pecado original.

 

Comentário nosso – Interessante a pena sugerida pelo colunista para o corrupto: “Não basta devolver o que roubou. Tem que perder o que já tinha antes de roubar. E passar a trabalhar duro para sobreviver”. E feliz a lembrança de que foi assim que Deus puniu Adão no Paraíso. Passou a ganhar o sustento com o suor do próprio rosto. E Eva a parir entre dores. (LGLM)

Comentário

Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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