(23/03/2020)
Outro dia, mães choravam no terreiro das casas pelos filhos que partiam sem saber se voltavam. Eram os anos 50, e o Brasil vivia a política de integração regional e de estímulo ao crescimento industrial– As cidades grandes eram a oportunidade de uma vida de prosperidade.
“Em um caminhão/ele joga a famia / chegou o triste dia / já vai viajar meu Deus, meu Deus, a seca terrível / que tudo devora / lhe bota pra fora / da terra natal. Ai, ai, ai, ai” (Patativa do Assaré)
O Brasil há muito tempo deixou de ser um país rural, muito embora as migrações sempre estiveram presentes na vida do seu povo, todas elas traumáticas e à custa de muita humilhação e perseverança.
Muda-se de um lugar para outro também por diáspora, sazonalidade… – Por nomadismo, preservando o genes dos sapiens caçadores-coletores*. E os motivos são os mais diversos, dentre eles, destacam-se: o econômico, o educacional, o cultural e o bélico.
Porém, ninguém disse que iria fácil conviver em um ambiente inóspito ou de caraterísticas de selva de pedra – As metrópoles são desumanas. A única forma de sobrevivência é a ilusão. E não há lugar mais longe do que o coração do homem.
Hoje, por uma questão mais xenofóbica do que sanitária, aqueles meninos foram vomitados de volta: tratados como escória. Confinados, dentro de um caminhão baú, são examinados feito bichos doentes, após viajarem léguas de sofrimento.
Há quem viva por lá. Quem fique por lá. Há quem morra por lá… – Mas, não há nada melhor do que se ter por quem voltar … – Principalmente porque “na volta, ninguém se perde”.
E as mães, que outrora choramingavam no terreiro de suas casas, agora veem seus filhos desembarcarem, sem lenço e sem documento, mas com aquele mesmo olhar pidão de quem nunca foi embora.
Misael Nóbrega de Sousa