Um governo cruel

By | 06/12/2020 9:03 am

O governo federal é a expressão viva da indiferença e da falta da sensibilidade que marca a triste passagem de Jair Bolsonaro pela Presidência

(Editorial do Estadão) 

 

Comandado por um presidente que tem evidente dificuldade para demonstrar empatia autêntica por qualquer um que não leve seu sobrenome, o governo federal é a expressão viva da indiferença que marca a triste passagem de Jair Bolsonaro pelo poder. A ministros sem currículo e sem o mínimo cabedal para as nobres tarefas que lhes foram concedidas pela irresponsabilidade bolsonarista, só resta empenhar-se em agradar ao chefe – e o fazem emulando fielmente a truculência tão característica de Bolsonaro.

 

Tome-se o exemplo do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Como se fosse titular do Ministério da Doença, o sr. Pazuello, inspirado no presidente, parece trabalhar em favor do coronavírus, facilitando-lhe a dispersão entre os brasileiros e agravando a pandemia. Na quarta-feira passada, contra todas as evidências, o ministro disse que a recém-encerrada campanha eleitoral, com suas aglomerações, “não trouxe nenhum tipo de incremento ou aumento de contaminação”, razão pela qual “não podemos mais falar em lockdown nem nada”.

 

Ora, o que aconteceu, segundo as informações disponíveis, foi o exato oposto. Tanto é assim que vários governos decidiram reforçar algumas das restrições que haviam sido abrandadas. Ao desestimular o isolamento social e fazer crer que as contaminações estão diminuindo, o ministro semeia confusão e colabora para desmoralizar os esforços de quem demonstra preocupação com o vírus.

 

Enquanto isso, o secretário executivo do Ministério da Saúde, Élcio Franco, a propósito das recomendações para os brasileiros nas festas de fim de ano, menosprezou o isolamento social, pois segundo ele “não tem eficácia”, malgrado seja preconizado pela comunidade científica mundial para reduzir a pandemia. Já em caso de suspeita de contaminação, Élcio Franco defendeu o “tratamento precoce”, que não existe senão no discurso dos xamãs bolsonaristas.

 

Sabe-se lá quantos brasileiros mais ficarão doentes, correndo risco de morte, como resultado do conflito de mensagens estimulado pelo governo. Para os propósitos de Bolsonaro, como se sabe, isso não tem a menor importância, já que, em suas inolvidáveis palavras, “todos vamos morrer um dia”. A única coisa que importa é livrar-se da responsabilidade pelas consequências da pandemia.

 

Assim, não surpreende que o governo tenha demorado tanto para formular um plano de vacinação e, também, que esse plano, afinal apresentado na terça-feira passada, seja tão aquém do necessário. A vacinação não somente se estenderá por um ano ou talvez até mais, como será destinada a uma parcela muito pequena da população.

 

Sem jamais ter sido prioridade do governo – ao contrário, o próprio presidente disse e repetiu em voz alta que a vacinação não seria obrigatória, como se a vacina fosse uma aspirina que se escolhe tomar ou não –, a imunização dos brasileiros contra o coronavírus entrará para a já extensa e variada lista das obrigações que Bolsonaro, como presidente da República, está deixando de cumprir. E neste caso colocando em risco a saúde de todos.

 

O ministro da Educação, Milton Ribeiro, expressou surpresa com a repercussão negativa. Ou seja, foi simplesmente incapaz de perceber a violência da medida, evidente por si mesma. É, portanto, muito pior do que a simples incompetência: trata-se de um governo sem qualquer sensibilidade, movido exclusivamente pelos delírios bolsonaristas de poder, nos quais o presidente e alguns de seus principais ministros não demonstram compaixão pelos pobres e os doentes.

 

Com um presidente que é fã declarado de torturadores, quem haverá de se dizer surpreso, afinal?

 

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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