Se você não sabe para onde vai, não importa o caminho que toma

By | 15/12/2020 10:36 am

(Thomas Traumann (*) 15.dez.2020 (terça-feira) – 6h00)

 

Todo debate presidencial começa com a mesma pergunta: “por que o senhor, ou a senhora, quer ser presidente?”. É tão feijão-com-arroz que os marqueteiros oferecem módulos prontos de respostas que variam entre o piegas (“fazer o bem para os mais pobres”), o egocêntrico (“porque quando eu…”) e o coach (“vamos gerar oportunidades”). Mas a pergunta, por mais singela que pareça, é definidora de uma campanha.

Jair Bolsonaro, por exemplo, não queria ser presidente para combater o déficit público, privatizar estatais e modernizar o Estado. Esses eram o pretexto da turma da Faria Lima para votar nele. Também não foi para acabar com a corrupção. Só quem não gastou 5 minutos olhando a carreira dele podia imaginar isso. A obsessão de Bolsonaro é acabar com o que ele chama de “estado petista”, um misto de direitos liberais que incluem as legislações ambientais e de direitos humanos, a ação das ONGs, o laicismo no serviço público, os sindicatos, a liberdade de imprensa, o movimento LGBTQI+, as universidades, a urna eletrônica, a diplomacia multilateral, as manifestações de rua, enfim “tudo isso daí”.

Passados 2 anos, Bolsonaro é uma catástrofe na saúde, acumula derrotas na economia, mas está entregando o desmonte da proteção ambiental e da diplomacia, sufoca a mídia não subserviente, libera novos tipos de agrotóxicos, acabou com o programa dos médicos cubanos e faz o que pôde para liberar o uso de armas, o garimpo e a grilagem de terras. Ainda prepara um avanço sobre a autonomia das universidades e mudanças na lei de aborto, além da escolha de um ministro do Supremo cujo único critério será ser “terrivelmente evangélico”. Para milhões de brasileiros, Bolsonaro está entregando o que prometeu.

Mas o que move os eventuais adversários de Bolsonaro? Sem responder sinceramente é difícil começar a pensar uma campanha. Como na frase do gato de Cheshire, em Alice no País das Maravilhas: “se você não sabe para onde quer ir, não importa o caminho que você toma”.

A seguir alguns caminhos que a oposição parece querer trilhar:

  • Mudar tudo – O lugar do antiestablishment está tomado por Bolsonaro. Não há hipótese de se repetir um 1989, quando os dois finalistas prometiam um Brasil pelo avesso.
  • Acabar com o bolsonarismo – Assim como o fim do mandato de Donald Trump não fará a política americana retornar aos tempos de bipartidarismo civilizado, é ilusão supor que uma eventual derrota de Jair Bolsonaro em 2022 irá devolver para dentro da caixa de Pandora o radicalismo solto nesses 2 anos. O bolsonarismo –aqui definido como um renovado movimento de direita populista– é muito maior que a figura do presidente e irá seguir ameaçando a política tradicional por anos. A política da guerrilha digital, com crises que duram o tempo de um trending topics e são substituídas por novas ações, veio para ficar.
  • Recolocar as coisas no lugar- Optar por chegar com cavalo branco para enfrentar os ímpetos golpistas do bolsonarismo é o caminho da frustração. A política brasileira nunca mais será a dos tempos de Tancredo, FHC e Lula. É possível derrotar o bolsonarismo nas urnas e delimitá-lo dentro dos espaços legais, mas é preciso reforçar em muitos as instituições capturadas por juízes, generais, almirantes, brigadeiros, promotores, delegados e guardas de ruas seduzidos pelo bolsonarismo. A sociedade terá de conviver com o radicalismo de direita por anos.
  • Um lugar na história – A política brasileira está cheia de nomes que imaginavam estar predestinados à Presidência, como Carlos Lacerda, Ulysses Guimarães, Leonel Brizola e José Serra. Ambições pessoais não são características necessariamente ruins em um político, mas guardam um defeito. Em geral, o personalismo leva o candidato a formar sua equipe na base de quem fala mais alto “Grande ideia, chefe!”. Para além dos acólitos é difícil imaginar que algum candidato em 2022 junte tantos fanáticos quanto o próprio Bolsonaro. Até porque o eleitor não está realmente interessado na trajetória do candidato. Ele quer saber, primeiro, se o sujeito e capaz de melhorar sua vida. Na campanha municipal do Rio, por exemplo, o ex-prefeito Eduardo Paes começou explicando as acusações sobre suas gestões. Ninguém deu pelota. Aquilo só interessava ao próprio Paes. A campanha só fluiu quando ele passou a falar do que faria se voltasse à prefeitura.
  • Volta ao Passado – Assim como Bolsonaro faz um passeio idílico pelo regime militar, parte considerável do PT vende a ideia de que havia uma terra sem males no Brasil pré-impeachment. As condições econômicas e as coalizações políticas são irreplicáveis. Esse discurso serve mais para reconstruir a história do PT e de Lula do que oferecer um caminho de futuro.
  • O lugar de Ali Kamel – Se tivesse de escolher, parte razoável dos principais políticos brasileiros iria preferir decidir a pauta do Jornal Nacional do que ocupar o terceiro andar do Palácio do Planalto. É inacreditável como ainda hoje, com o Google, Youtube e o Facebook sendo as maiores fontes de informação dos brasileiros, a TV Globo magnetiza a opinião de tantas autoridades. “Ah, o Jornal Nacional não deu tal matéria…”“Ah, o jeito que o apresentador William Bonner leu tal notícia…”. Tem muita gente que não quer o lugar de Bolsonaro, mas o do diretor geral de jornalismo da Globo, Ali Kamel.

Muitos caminhos levam a Brasília, mas todos começam com o candidato decidindo por que, afinal, ele quer ser presidente do Brasil?

(*) Thomas Traumann, 53 anos, é jornalista, consultor de comunicação e autor do livro “O Pior Emprego do Mundo”, sobre ministros da Fazenda e crises econômicas. Trabalhou nas redações da Folha de S. Paulo, Veja e Época, foi diretor das empresas de comunicação corporativa Llorente&Cuenca e FSB, porta-voz e ministro de Comunicação Social do governo Dilma Rousseff e pesquisador de políticas públicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Dapp). Escreve semanalmente para o Poder360, sempre às terças-feiras.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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