“Punição ao desvario” defende o Correio Braziliense

By | 19/02/2021 12:33 pm

”Não há tempo para se perder com quem não respeita a democracia”

“Tu sabes, conheces melhor do que eu a velha história. Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada (…)”. Esses inquietantes versos pertencem ao longo poema No caminho, com Maiakóvski, do poeta e artista plástico fluminense Eduardo Alves da Costa, radicado em São Paulo, que fará 85 anos em 6 de março. Foram compostos em 1968, às vésperas do Ato Institucional nº 5 (AI-5) — o mais duro instrumento do regime militar iniciado em 1964 —, e se transformou em bandeira de resistência, inclusive de movimentos estudantis. E nos anos 1980 esses versos também foram estampados em camisetas da campanha das Diretas Já.

Usando um velho clichê, é preciso cortar o mal pela raiz, neste caso, o extremismo do parlamentar e de outros radicais. Se as instituições se calarem, podem ganhar força os ataques à democracia que vêm sendo registrados em diversos países nos últimos anos. Em situações extremas, vale lembrar de momentos decisivos da história do século 20, com exemplos gritantes de como a omissão e a indiferença de governos e sociedades custaram a liberdade. O maior de todos é o nazifascismo que emergiu na Alemanha a partir de 1918, na pele de um obscuro cabo da Primeira Guerra Mundial chamado Adolf Hitler. Tratado com galhofa, ele moveu multidões e o trágico resultado da sua histeria é muito bem conhecido.

Sobre essa triste página da história da humanidade foi construída uma obra-prima do cinema chamada O ovo da serpente, lançada pelo cineasta sueco Ingmar Bergman (1918-2007), em 1977, com David Carradine e Liv Ullmann. A história se passa em Berlim, em 1923. O protagonista é Abel Rosenberg, trapezista judeu desempregado que vai a Berlim tentar descobrir porque seu irmão, Max, se suicidou. Ele, então, encontra Manuela, sua cunhada, que trabalha como corista numa boate e, juntos, sobrevivem com grandes dificuldades sob a crescente recessão econômica que assola a Alemanha após a Primeira Guerra. Sem compreender com clareza as profundas transformações políticas em andamento, eles vão trabalhar numa clínica e descobrem uma série de experimentos com seres humanos em meio à ascensão nazista. O sistema político falido, a fome, a miséria, a hiperinflação e a violência estouram, um ambiente propício para a incubação do “ovo da serpente” do nazismo, com o surgimento de falsos salvadores egocêntricos, racistas e preconizadores de discurso de ódio. Ninguém fez nada, e o ovo gerou a serpente do nazismo.

Exagero fazer paralelo com os dias atuais? Não necessariamente. A tolerância com o discurso de extremistas como o deputado e outros que vêm estimulando atos antidemocráticos precisa ser coibida, porque acaba servindo de incentivo para outros. O totalitarismo tem várias caras e vários nomes. Por isso, é preciso que o responsável pelas ameaças receba punição à altura de seu desvario. E que o caso seja logo superado, para que o Congresso possa voltar a se dedicar aos seus temas prioritários, elencados pelos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e Câmara dos Deputados, Arthur Lira: a aprovação de um novo auxílio emergencial para os que perderam a renda com o impacto do coronavírus e o avanço com as reformas, tão necessárias para que o Brasil volte a trilhar o caminho do desenvolvimento. Não há tempo para se perder com quem não respeita a democracia.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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