Comandantes militares colocam cargos à disposição e descartam golpismo

By | 30/03/2021 11:46 am

Ministro da Defesa negou apoio a medidas de exceção insinuadas por Bolsonaro e foi demitido

(Igor Gielow, na Folha)

Os comandantes do Exército, Marinha e Força Aérea decidiram colocar seus cargos à disposição do novo ministro da Defesa, general Walter Braga Netto, em uma reunião prevista para o começo da manhã desta terça (30).

Eles querem acompanhar a saída do general Fernando Azevedo da pasta, demitido pelo presidente Jair Bolsonaro nesta segunda-feira (29) após seguidas negativas de apoio político ao governo federal.

Segundo um interlocutor de Azevedo, o limite da relação dos dois foi atingido a partir da semana passada, quando Bolsonaro voltou a insinuar que queria o apoio do Exército para aplicar medidas de exceção como o estado de defesa em unidades da Federação que aplicam lockdowns contra a pandemia.

A relação entre ambos já vinha desgastada pelo que um aliado do presidente qualificou de falta de apoio político das Forças Armadas, decididas a se afastar dos fardados que ocupam o governo federal.

Para esse aliado, há pouco reconhecimento ao fato de que Bolsonaro trabalhou para manter benesses à categoria com a reforma previdenciária e administrativa das Forças, aprovada em 2019, além de garantir investimentos na maioria dos programas bélicos prioritários.

O problema foi explicitado por Azevedo em sua carta de demissão, na qual omite que foi demitido, mas ressalva que buscou preservar as Forças Armadas como instrumentos de estado —em oposição à ideia bolsonarista de uma milícia de apoio ao governo.

O combinado entre os comandantes, que se encontraram com Azevedo e depois fizeram uma reunião, era entregar o cargo conjuntamente. Braga Netto pediu para que eles esperassem e se encontrassem nesta terça-feira.

Se Edson Leal Pujol (Exército), Ilques Barbosa (Marinha) e Antônio Carlos Bermudez (Aeronáutica) saírem juntos, isso terá sido inédito. Os dois últimos podem ficar, caso Braga Netto os convença a evitar mais turbulência.

Já Pujol é o único cuja permanência não é especulada por ninguém, dado o grau de animosidade entre ele e Bolsonaro. O presidente já havia tentado tirá-lo do cargo no ano passado, como a Folha revelou.

É uma disputa que vem do ano passado, simbolizada no dia em que Pujol ofereceu o cotovelo a um aperto de mão do presidente. O comandante chamou o esforço contra a Covid-19 de maior missão de sua geração, enquanto o chefe promovia aglomerações e falava em “gripezinha”.

Tal diferença se acentuou. Como chefe da Força mais importante, coube a Pujol riscar a linha no chão ao dizer em uma palestra que os militares tinham de ficar fora da política. A crise seguiu com a insistência do general Eduardo Pazuello em se manter na ativa enquanto conduzia a sua criticada gestão no Ministério da Saúde.

Com as novas insinuações de Bolsonaro sobre os usos do que chamou de “meu Exército”, as insatisfações foram transparecendo, como a Folha mostrou na semana passada. Agora, transbordaram.

Em reunião posterior com os integrantes do Alto-Comando do Exército, por videoconferência, Pujol discutiu os cenários.

Segundo o pouco que transpareceu até aqui do encontro, as Forças querem dar um recado claro a Braga Netto de que não aceitariam ser usadas por Bolsonaro em qualquer iniciativa golpista.

Uma forma de isso acontecer sem sugerir insubordinação é a costura dos nomes dos novos comandantes. Na FAB e na Marinha a situação é relativamente tranquila, por serem forças de menor peso relativo.

No Exército, o ideal debatido seria a apresentação de nomes com apoio consensual do Alto-Comando e que não fossem muito próximo do bolsonarismo. Há uma questão a avaliar, prezada pelos militares, que é a antiguidade.

Tradicionalmente, o ministro da Defesa apresenta três nomes para o presidente escolher para o comando, todos os mais antigos da Força, e na maioria das vezes o que tem mais tempo de caserna leva.

A partir desta quarta (31), o mais longevo general de quatro estrelas da ativa será José Luiz Freitas (Operações Terrestres), que irá à reserva em agosto. O mais antigo, Decio Schons (Departamento de Ciência e Tecnologia), vai à reserva neste dia.

Um nome denso é o do número 2 da Força, Marco Antônio Amaro dos Santos, que será o segundo mais antigo. O terceiro será Paulo Sérgio (Pessoal), que irritou Bolsonaro ao conceder entrevista na qual mostrou ações do Exército contra a Covid-19.

Na sequência vêm Laerte Souza Santos (Comando Logístico) e o comandante do Nordeste, Marco Antônio Freire Gomes, nome bastante ventilado, apesar de nem fazer parte dos três mais antigos. Todos são vistos como muito próximos e alinhados a Pujol.

Seja qual for o desfecho da reunião desta terça, o certo é que Bolsonaro contratou uma ameaça de crise militar com sua mudança ministerial desta segunda. E na quarta (31) se completam 57 anos do golpe de 1964, uma data central e sensível do calendário militar brasileiro.

 

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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