Gilmar Mendes vota contra liberar cultos e missas na pandemia; STF retoma julgamento nesta quinta

By | 07/04/2021 8:44 pm

Ministro criticou ‘política negacionista’, contrária, segundo ele, à fraternidade. Para advogado do governo, ‘verdadeiros cristãos estão sempre dispostos a morrer’ pela liberdade de culto.

(Rosanne D’Agostino, G1)

O ministro Gilmar Mendes votou nesta quarta-feira (7), em julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), contra a liberação de celebrações religiosas presenciais, como cultos e missas, em razão da pandemia de Covid-19.

Relator do processo, Mendes foi o primeiro ministro a votar. Após o voto dele, já no fim da tarde, o julgamento foi interrompido e será retomado nesta quinta-feira (8).

A discussão no Supremo se dá no momento mais crítico da pandemia — 4.211 mortes por Covid-19 em 24 horas. Ao todo, até esta terça-feira (6), o país registrava 337.364 vítimas. Os casos confirmados desde o começo da pandemia são 13,1 milhões — brasileiros que têm ou já tiveram a doença.

O início do julgamento foi marcado para esta quarta-feira pelo presidente do STF, Luiz Fux, após decisões conflitantes de Nunes Marques e do próprio Gilmar Mendes sobre o assunto.

No sábado (3), ao julgar pedido da Associação Nacional dos Juristas Evangélicos (Anajure), o ministro Nunes Marques aceitou o argumento da liberdade religiosa e proibiu que celebrações em templos e igrejas sejam vetadas por estados, municípios e Distrito Federal em razão da pandemia.

Na segunda (5), o ministro Gilmar Mendes tomou decisão divergente. Ele rejeitou ação do partido PSD — que pedia a derrubada do decreto estadual que proibiu cultos e missas em São Paulo devido à pandemia — e enviou o caso ao plenário do STF.

“Quer me parecer que apenas uma postura negacionista autorizaria resposta em sentido afirmativo, uma ideologia que nega a pandemia que ora assola o país e que nega um conjunto de precedentes lavrados por este tribunal durante a crise sanitária que se coloca”, escreveu o ministro.

Voto do relator

Ao votar na sessão desta quarta, Gilmar Mendes afirmou que o Supremo já assegurou autonomia aos estados e municípios para que tomem medidas de combate ao coronavírus, inclusive com restrições a atividades religiosas.

“Temos diante de nós a maior crise epidemiológica dos últimos 100 anos”, disse Gilmar Mendes. “Uma tragédia cujo enfrentamento requer decisiva colaboração de todos os entes e cujas consequências administrativas são sentidas de modo mais intenso pelos pequenos estados.”

O ministro criticou a “agenda política negacionista, que se revela, em toda a dimensão contrária à fraternidade tão ínsita ao exercício da religiosidade” e afirmou que a proteção constitucional “jamais pode ser diminuída”.

O ministro lamentou o número de mortes causado pela Covid-19 e afirmou que o advogado-geral da União, André Mendonça, parece ter vindo de uma “viagem a Marte e que estava descolado de qualquer responsabilidade institucional”.

Mendes também criticou o procurador-geral da República. Augusto Aras havia pedido ao STF que a ação fosse encaminhada a Nunes Marques. “Não se escolhe relator”, disse.

“Parece que está havendo um certo delírio. É preciso que cada um de nós assuma sua responsabilidade”, afirmou o ministro.

Ainda segundo Gilmar Mendes, a liberdade religiosa é a liberdade de manifestar a religião, “direito submetido à reserva legal”, e a Constituição “não alberga proteção somente à fé cristã”.

O ministro argumentou que diversos países já adotaram medidas semelhantes e não foram taxados de autoritários.

“A lei deve proteger os templos e não deve interferir nas liturgias, a não ser que assim o imponha algum valor constitucional de maior peso.”

Para o ministro, “não há como articular as restrições impostas com o argumento de violação ao dever de laicidade. Também não comove a tentativa de atrelar excessividade à medida”.

Mendes disse que o pior erro na formulação das políticas públicas é a omissão.

“É grave que, sob o manto da competência exclusiva ou privativa, premiem-se as inações do governo federal, impedindo que estados e municípios, no âmbito de suas respectivas competências, implementem as políticas públicas essenciais. O estado garantidor dos direitos fundamentais não é apenas a União, mas também os estados e os municípios.”

Segundo argumento o ministro, não fosse o reconhecimento pelo STF da autonomia de estados e municípios para atuar na pandemia, a situação sanitária do país estaria ainda pior.

“E esse é um aprendizado que temos no Brasil, infelizmente — é que as situações trágicas ou graves ainda podem piorar. Às vezes, o poço parece que não tem fundo”, declarou.

Ao finalizar o voto, Mendes afirmou que o país se tornou um “pária internacional” no âmbito da saúde. “Diante desse cenário, faz-se impensável invocar qualquer dever de proteção do estado que implique a negação à proteção coletiva da saúde”.

“Ainda que qualquer vocação íntima possa levar à escolha individual de entregar a vida pela sua religião, a Constituição de 88 não parece tutelar um direito fundamental à morte. A essa sutil forma de erodir a normatividade constitucional deve-se mostrar cada vez mais atento este STF, tanto mais se o abuso do direito de ação vier sob as vestes farisaicas, tomando o nome de Deus para se sustentar o direito à morte”, complementou.

Governo e PGR defendem manter cultos

No começo da sessão, o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), André Mendonça, defendeu que os cultos devem ser autorizados e que “sem vida em comunidade não há cristianismo”.

“Não estamos tratando de um debate sobre vida e morte. Todo cristão sabe e conhece os riscos dessa doença e sabe que precisa tomar cuidados e cautelas diante dessa enfermidade. Não se trata de uma discussão política. Todos nesta discussão defendemos a vida”, disse.

O advogado-geral disse ainda que é injusto fechar templos e atividades religiosas. Segundo ele, “os verdadeiros cristãos estão sempre dispostos a morrer para garantir a liberdade de religião e de culto”.

Oito interessados na ação também apresentaram seus argumentos à Corte. Enquanto entidades religiosas afirmaram que as medidas sanitárias são excessivas, que a igreja é alvo de discriminação e que não existe culto virtual, representantes de partidos argumentaram que o isolamento social é necessário e que muitos outros estabelecimentos também estão fechados.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, argumentou que os cultos e missas devem ser permitidos, desde que tomadas as medidas preventivas.

Aras disse que estados e municípios têm competência e autonomia para estabelecer regras, mas que a liberdade religiosa é cláusula pétrea.

“A Constituição, ao dispor sobre liberdade religiosa, assegura livre exercício dos cultos religiosos. Decretos e atos, ainda que decorrentes de uma lei ordinária, podem ter força para subtração e direitos fundamentais postos na lei maior? Parece-nos que não”, acrescentou.

Ainda segundo Aras, “é necessário relembrar o lugar da religião num estado democrático de direito e ter presente que o estado é laico, mas as pessoas não são”.

“A ciência salva vidas. A fé também. Não há oposição entre fé e razão. Onde a ciência não explica, a fé traz a justificativa que lhe é inerente”, disse.

O plenário do Supremo já decidiu que estados e municípios têm autonomia para tomar medidas relacionadas à pandemia, o que não isenta o governo federal de agir.

 

Nossa opinião -A votação deve ser concluída amanhã. Os votos dos demais ministros provavelmente serão mais curtos do que os do relator Gilmar Mendes. E a tendência acreditamos é o STF votar contra a abertura de , missas e cultos para o público, coerente com os votos dados até agora em questões semelhantes, mantendo a autoridade de governadores e prefeitos. Os dois  procurador e advogado defenderam os interesses políticos de Bolsonaro e com UTIs quase lotadas, Bolsonaro ainda está querendo aglomerações em cultos da Teologia da Prosperidade.(LGLM)

 

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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