LSN tem sido usada de formas recorrentes pelo governo do presidente Jair Bolsonaro para investigar opositores e críticos
A Câmara aprovou nesta terça-feira, 4, projeto que revoga a Lei de Segurança Nacional (LSN), legislação criada ainda na ditadura e que tem sido usada pela gestão de Jair Bolsonaro para investigar opositores. A votação foi simbólica, mas contou com a resistência do governo, que orientou deputados da base a se posicionarem de forma contrária, e do PSL, que atuou para tentar tirá-la da pauta. O texto ainda precisa passar pelo aval do Senado.
No lugar da LSN, deputados criaram a chamada “Lei do Estado Democrático”, que traz como pressupostos, entre outros pontos, instituir o crime de golpe de Estado, inexistente na legislação atual nestes termos.
A relatora, deputada Margarete Coelho (PP-PI), apresentou uma revisão da lei a partir de um projeto de 2002 apresentado pelo então ministro da Justiça Miguel Reale, de autoria do deputado Helio Bicudo (PT-SP). O parecer prevê punições para práticas como incitar guerra civil, insurreição e espionagem.
Há ainda um capítulo sobre eleições. O texto prevê prisão de um a cinco anos e multa para quem fizer disparos da fake news em massa durante o período eleitoral . Na noite de ontem, deputados ainda avaliavam se este trecho seria mantido.
Bolsonaro é alvo de ações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que investigam, justamente, a contratação de empresas de tecnologia para disparo de mensagens em massa pelo WhatsApp durante a campanha que o elegeu, em 2018. Adversário do presidente na disputa eleitoral, o petista Fernando Haddad alega que a prática é irregular e por isso pede a cassação da chapa eleita. O tribunal já rejeitou outros processos semelhantes de autoria da coligação do ex-candidato Ciro Gomes (PDT) por falta de provas.
Na forma vigente, em sua sexta versão, a Lei da Segurança Nacional foi sancionada em 1983, durante a ditadura militar, pelo presidente João Figueiredo, para listar crimes que afetem a ordem política e social – incluindo aqueles cometidos contra a democracia, a soberania nacional, as instituições e a pessoa do presidente da República.
Ao revogar a LSN, a Câmara se antecipa a uma possível decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) para limitar o alcance da legislação atual. Ao menos cinco ações de partidos políticos, sob relatoria do ministro Gilmar Mendes, questionam trechos da regra em vigor, e magistrados já indicaram ver inconstitucionalidades.
O Estadão mostrou, em março, que o número de procedimentos abertos pela Polícia Federal para apurar supostos delitos contra a segurança nacional aumentou 285% nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro, na comparação com o mesmo período das gestões Dilma Rousseff e Michel Temer. Houve um total de 20 inquéritos entre 2015 e 2016. Já entre 2019 e 2020, foram 77 investigações.
A lei serviu, por exemplo, para a Polícia Civil do Rio intimar o youtuber Felipe Neto (após o influenciador digital chamar Bolsonaro de “genocida”) e para o Ministério da Justiça pedir a investigação da publicação de uma charge na qual Bolsonaro aparece transformando a cruz vermelha (símbolo de hospitais) na suástica nazista.