O Centristão
Bolsonaro está empurrando o próprio Centrão a encontrar uma alternativa eleitoral a ele
O único golpe bem-sucedido até aqui foi o do Centrão e é quem parece que sairá vitorioso, não importa a próxima campanha eleitoral. Essa denominação para forças políticas diversas e sua forma de atuação existe há mais de 30 anos, mas a República do Centristão tem como fundador Jair Bolsonaro.
Esses agrupamentos políticos que trabalham em busca de acomodação nos cofres públicos (ou pedaços da máquina pública, o que vem a dar no mesmo) conquistaram sob Bolsonaro ferramentas de poder que jamais tiveram. Capturaram o orçamento – incluindo gorda fatia dos gastos discricionários – e estão promovendo o retrocesso das regras eleitorais em benefício próprio. São os donos de fato da agenda política.
Dinheiro e as regras do jogo garantem a consolidação desses grupos no centro do poder. A noção de “agenda nacional” por parte desses partidos e seus caciques se manifesta de forma abrangente somente para cuidar de seus interesses mais imediatos, e isso se dá tanto no plano de “políticas públicas” como no plano de plataformas eleitorais.
Caso emblemático é o show que o presidente da Câmara armou para examinar política de preços de combustíveis pela Petrobras. Gasolina cara e inflação alta atrapalham políticos em qualquer lugar e época – dos dois Poderes. Há relatos conflitantes quanto ao grau de coordenação entre Legislativo e Executivo nessa tentativa de reedição do que há de pior na interferência populista na formação de preços básicos, disfarçada de preocupação social, mas a convergência de interesses é fato objetivo.
Difícil para os caciques do Centrão continua sendo entender como assim Bolsonaro não entende um fato tão evidente da política. Seres perfeitamente racionais (em contraste com o presidente), dominando instâncias decisivas no próprio Planalto, esses experientes operadores políticos desistiram da empreitada de decifrar Bolsonaro, que evidentemente consideram útil no curto prazo – contanto que ele pare de promover outros “7 de Setembros” (sempre uma dúvida).
A grande incerteza e imprevisibilidade associadas a Bolsonaro promoveram no coração do Centristão certa urgência em procurar saídas para os comportamentos do atual mandatário, sem considerar a eventualidade de um impeachment em função de algum “freak event”. Nesse sentido, parte relevante do Centrão e algumas das principais elites dirigentes na economia e sociedade civil estão em sintonia.
Assim, a óbvia “saída” do Centrão para o que mais detesta, a imprevisibilidade, está em encontrar alternativa eleitoral a Bolsonaro. Ou seja, é grande a probabilidade de que a tal terceira via surja por ali, provavelmente numa grande concertação política. É o que indicam movimentações de fusão de partidos (PSL e DEM) e conversas entre operadores de várias tendências (centro-esquerda e centro-direita). O pressuposto de todos é o de que há um enorme espaço eleitoral a ser ocupado por agremiações políticas experientes, e que ainda existe tempo para isso.
Bolsonaro deu impulso às forças adversárias ainda difusas e desarticuladas ao se desmoralizar nos eventos em torno do 7 de Setembro, que demonstraram não só a incapacidade de operar um golpe, mas, sobretudo, a inexistência de qualquer plano para o País. Ele jogou definitivamente as elites dirigentes para uma espécie de “lado de lá” da linha divisória entre o tolerável e o inaceitável – e transformou-se em intragável.
O Centristão foi fundado como consequência que não era inevitável da onda disruptiva de 2018, que não tem condições de ser repetida no ano que vem. Falta principalmente o “impulso”, o “ímpeto”, que Bolsonaro acabou representando, e o “anti” se divide entre mais de um alvo. É hora dos profissionais. O Centristão não depende de Bolsonaro para prosperar.
*JORNALISTA E APRESENTADOR DO JORNAL DA CNN