Sem conteúdo, Bolsonaro tem forma, caneta e dobra a aposta no negacionismo para 2022

By | 03/10/2021 2:10 pm

Sem o discurso de 2018 e com uma coleção de desastres do governo, o presidente sabe que não sobrevive à realidade

(Eliane Cantanhêde, no Estadão, em 03/10/2021)

O presidente Jair Bolsonaro jogou fora todo o conteúdo e os falsos compromissos, mas mantém a forma e a técnica que lhe deram a vitória em 2018: uma combinação de viagens por todo o Brasil com o uso maciço da internet. Basta sorrir, produzir vídeos, tirar selfies, e o gabinete do ódio e os robôs, inclusive os de carne e osso, fazem o resto.

Sem a facada, sem o discurso de 2018 e com uma coleção de desastres do governo, ele sabe que não sobrevive à realidade, à pandemia, à economia e a perguntas, sejam de jornalistas, sejam de adversários, e prefere multidões que não questionam nada, só gritam “mito”. Vai ter de fugir dos debates e entrevistas.

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O presidente Jair Bolsonaro durante a cerimônia que marca os mil dias de governo no Palácio do Planalto Foto: Ueslei Marcelino/Reuters

Pode simplesmente não aparecer e deixar os adversários falando sozinhos e se atacando uns aos outros, como em 2018. Antonio Carlos Magalhães, o ACM, dizia: “Reunião que eu não vou não vale”. Bolsonaro pode adaptar: “Debate que eu não vou não vale”. Mas os debates entre os outros serão uma saraivada de verdades contra ele.

Bolsonaro viajou todos os dias da semana passada. A Teotônio Vilela (AL), Teixeira de Freitas (BA), Boa Vista (RR), Belo Horizonte (MG) e Maringá (PR), do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros, nome recorrente da CPI na compra de vacinas e na investigação de Bolsonaro por prevaricação. Barros, porém, tem peso no Centrão e no Paraná, junta gente para a campanha de Bolsonaro animar a turba “presencial” e a “virtual”.

Após 28 anos de política, para onde tragou três filhos, Bolsonaro casou por conveniência com o PSL (que lucrou com uma gorda bancada na Câmara e um gordo Fundo Partidário), mas saiu em novembro de 2019, não conseguiu criar o Aliança pelo Brasil e tenta o PTB, transmutado de trabalhista para integralista por Roberto Jefferson, ora preso, e o PP de Ciro Nogueira, da Casa Civil, e Arthur Lira, presidente da Câmara. Mas ele não quer entrar num partido, quer engolir o partido.

Assim como passou por uma dezena de siglas, antes do PSL, Bolsonaro também teve uma longa lista de nomes para sua vice em 2018: Janaina PaschoalMagno MaltaLuiz Philippe de Orleans e BragançaAugusto Heleno… Deu o general de quatro-estrelas Hamilton Mourão, mas tanto fazia e o desdém migrou da campanha para o governo.

Sem vice, sem partido, sem facada, sem nenhuma das bandeiras de 2018 e com o rastro de destruição na pandemia, no ambiente, na educação, na cultura, na política externa, nas relações federativas, no equilíbrio institucional, o que sobra para Bolsonaro dizer numa campanha? Que a economia está uma maravilha, os preços estão lá embaixo, a fome e a miséria não estão de volta?

E tem a CPI… O relatório final será anunciado ao Brasil e ao mundo nos dias 19 e 20, com dados, depoimentos, trocas de mensagens e 600 mil mortos, provando o quanto Bolsonaro trabalhou contra isolamento social, máscaras e vacinas e a favor de remédios comprovadamente ineficazes – em alguns casos, perigosos. Ou seja: como trabalhou a favor do coronavírus e contra a vida.

Pela guinada dos senadores e depoentes bolsonaristas na CPI, a estratégia é dobrar a aposta no negacionismo e na fantasia do comunismo, culpando governadores pela crise econômica, o Supremo pela inação dolosa do governo e insistindo na tese da “imunidade de rebanho”. A queda de contaminações, internações e mortes é resultado direto das vacinas, não dessa enganação, mas a verdade cristalina, reluzente, interessa ao real rebanho?

Assim, a reeleição não será fácil, porque é vazia de conteúdo, se sustenta só na forma e o que não falta à oposição é munição. Entretanto, a lição de 2018 não deve ser desprezada: o que conta não é a realidade, é a manipulação dela. E, agora, Bolsonaro tem o cargo, a caneta e um quarto da população anestesiada. Não subestimem Bolsonaro e seus estrategistas.

COMENTARISTA DA RÁDIO ELDORADO, DA RÁDIO JORNAL (PE) E DO TELEJORNAL GLOBONEWS EM PAUTA

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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