Os imprudentes pressionam o Senado
É grande a pressão para que o Senado tolere e contribua com o desgoverno de Jair Bolsonaro. Que o compromisso da Casa continue a ser com a Constituição e com o País
Naturalmente, esse papel de prudência e responsabilidade do Senado encontra oposição em quem não deseja prudência, tampouco responsabilidade. Nos últimos dias, governo federal e presidência da Câmara aumentaram o tom das críticas contra o Senado, em descarada tentativa de atribuir à Casa a culpa pelo descumprimento do teto dos gastos, na jogada para viabilizar o aumento do valor do Auxílio Brasil. É grave essa manobra para inverter responsabilidades.
Na segunda-feira passada, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), explicitou o discurso diversionista. “Eu preferia que o Senado tivesse votado o Imposto de Renda (IR), que nós tivéssemos feito hoje um programa permanente dentro do teto”, disse Lira, referindo-se ao projeto de lei que altera a cobrança do Imposto de Renda. Na semana anterior, o presidente da Câmara já tinha reclamado que o Senado “não quer taxar quem ganha muito e não paga nada”.
O projeto de reforma do IR tem impacto direto sobre a atividade econômica, os investimentos privados e a receita dos três níveis da Federação. É assunto que merece especial cuidado. A tramitação na Câmara foi atabalhoada, para dizer o mínimo. No momento em que foi votado, o texto final do projeto nem sequer era conhecido pelos deputados, que votaram sem saber o que seu voto representava para o Estado e para os cidadãos. Só depois os parlamentares descobriram que a redação aprovada na Câmara significava perda de receita de R$ 21,8 bilhões para a União e de R$ 19,3 bilhões para Estados e municípios.
Não corresponde aos fatos, portanto, dizer que o Senado é o responsável pelo descumprimento do teto dos gastos em razão da não aprovação da reforma do IR. Ora, não votar atropeladamente o texto aprovado pelos deputados é rigorosa manifestação de responsabilidade fiscal. Se tivessem simplesmente chancelado o que veio da Câmara, os senadores teriam complicado ainda mais as finanças públicas.
A tática de responsabilizar o Senado pela atual situação fiscal também foi usada pelo governo federal. No domingo passado, o ministro da Economia, Paulo Guedes, comentou a respeito do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG): “Ele precisa avançar com a reforma (administrativa), ele precisa nos ajudar a fazer as reformas. Ele não pode fazer militância”.
O governo Bolsonaro é esquisito. Não trabalha para aprovar nenhuma reforma. Seu objetivo explícito é apenas prover instrumentos para a reeleição de Jair Bolsonaro. No entanto, quando pressionado sobre suas incongruências, reclama dos outros. O ministro da Economia, que descumpriu desavergonhadamente seu compromisso de respeitar o teto de gastos, tenta agora iludir a população com novos diversionismos. Além de não ser uma reforma administrativa – chamá-la assim é enganoso –, a atual PEC propondo alterações do funcionalismo não alivia as contas públicas de 2022, uma vez que suas propostas atingem apenas novos funcionários.
A especial relevância política do Senado neste ano não se deu por se curvar aos interesses do Palácio do Planalto. Sua contribuição ao País veio precisamente por meio do cumprimento independente de suas atribuições institucionais. Foram vários os episódios de responsabilidade do Senado. Por exemplo, a não votação às pressas da nova legislação eleitoral, a rejeição liminar do pedido de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes e a devolução da MP 1.068/2021, que alterava o Marco Civil da Internet.
É grande a pressão para que o Senado tolere e contribua com o desgoverno de Jair Bolsonaro. Que o compromisso da Casa continue a ser com a Constituição e com o País.
- A maneira equilibrada como tem se comportado o Senado Federal, mostra a importância do sistema bicameral. Enquanto os deputados federais votam de forma inconsequente, pondo em primeiro lugar os seus próprios interesses, os senadores são mais comedidos e não tem aprovados determinados projetos que são prejudiciais ao país. Os deputados só pensam na sua reeleição e ajudam o Governo Bolsonaro em tudo que possam aumentar as verbas que podem destinar aos seus redutos eleitorais e em programas que possam ajudar Bolsonaro na sua tentativa de reeleição.
- Você poderia perguntar: por que os senadores agem de forma diferente dos deputados? Há várias razões, mas vamos alinhar apenas três delas. Primeiro por que na sua maioria os senadores têm mais experiência administrativa. Muitos deles já foram governadores e prefeitos de grandes cidades e conhecem mais de perto os problemas de quem governa. Em segundo lugar, na media, são mais velhos e mais experientes. Para ser senador o cidadão tem que ter, no mínimo 35 anos de idade. Para ser deputado qualquer “menino” de 21 anos de idade, sem nenhuma experiência, pode ser eleito. E, talvez a razão mais importante, para o comedimento dos senadores é que a maioria deles não está disputando a reeleição nas próximas eleições. Ao todo são 81 senadores, mas apenas 27 deles precisam disputar a reeleição, pois os outros 54 têm mais quatro anos de mandato pela frente. E entre estes 27 que podem disputar a reeleição há alguns que ainda têm juízo e comedimento. Afinal nem todo político é de baixa qualidade.
- Em consequência ai de nós se o Senado não fosse mais equilibrado e comedido do que a Câmara, totalmente dominada pelo Centrão e pelos sequazes de Bonsolaro. (LGLM)