Congresso articula aumentar ‘fundão’ e incluir emendas de relator

By | 28/10/2021 9:14 am

A desfaçatez da PEC dos Precatórios

Com a PEC 23/21, o Congresso articula aumentar o Fundo Eleitoral para R$ 5 bilhões e incluir emendas de relator no valor de R$ 16 bilhões

O governo de Jair Bolsonaro tem tratado a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 23/21, que limita o pagamento dos precatórios, como se fosse medida imprescindível para as finanças estatais e o funcionamento dos serviços públicos. A realidade é, no entanto, muito diferente. Enquanto o Executivo federal tenta vender a ideia de que seria imprescindível dar um calote nas dívidas reconhecidas pela Justiça – afinal, é disso que trata a PEC dos Precatórios –, o Congresso articula aumentar o Fundo Eleitoral de R$ 2 bilhões para R$ 5 bilhões, além de incluir emendas de relator no valor de R$ 16 bilhões.

Eis a desfaçatez completa com o Direito e o interesse público. O governo de Jair Bolsonaro acionou um meio excepcionalíssimo (propõe mudar a Constituição) para que seja autorizado a não cumprir obrigações reconhecidas pela Justiça. Pretende, assim, institucionalizar da forma mais solene possível o calote. O descaramento, no entanto, não termina aí. A ideia negociada no Congresso é usar o dinheiro “poupado” pelo calote em campanhas eleitorais e emendas parlamentares.

Como se observa, a PEC dos Precatórios não é ruim apenas em razão dos meios utilizados, ao dar autorização para que o Estado não cumpra uma de suas obrigações mais básicas, que é pagar os credores. A medida é profundamente equivocada também em razão de seus fins. A depender das negociações em curso no Congresso, o dinheiro do calote servirá não somente para distribuir dinheiro aos famintos – que é o pretexto oficial do drible nos credores –, mas para saciar a voracidade eleitoreira de partidos e políticos fisiológicos.

Trata-se de apropriação abusiva por parte do Estado de recursos dos cidadãos e empresas. Deve-se recordar que o pagamento de precatórios não está na esfera de decisão do poder público. É uma obrigação reconhecida pela Justiça. Ou seja, um governo que se preocupa com fortalecer a segurança jurídica – isto é, um governo que não ignora que a existência de um ambiente de negócios com regras previsíveis é condição indispensável para o desenvolvimento social e econômico do País – não propõe, tampouco faz qualquer movimento para alterar o pagamento de precatórios.

Assim, com a PEC dos Precatórios, o presidente Jair Bolsonaro contraria, da forma mais incisiva possível, seu discurso de campanha, em que prometeu destravar a economia e dar um novo dinamismo aos negócios. É impossível estimular a economia com alteração das condições de pagamento de precatórios. No caso, não se pode sequer dizer que seria uma alteração das regras com o jogo em andamento. Trata-se de mudança das regras – e do resultado – com o jogo já finalizado. Perante um governo que ignora suas responsabilidades, é preciso recordar a realidade mais básica: todo precatório é resultado de decisão judicial transitada em julgado, sem possibilidade de recurso.

Nessa história absurda – a tentativa de criar na Constituição uma exceção para que o Estado não cumpra decisão judicial, aproveitando o dinheiro “poupado” com o calote para campanha eleitoral e emendas de relator –, há ainda outro grave defeito. Não é apenas que o Estado deveria cumprir suas obrigações judiciais, que recurso público não deveria ser destinado a partido político e que emenda de relator não deveria existir. O pagamento de precatórios representa o retorno de dinheiro que estava indevidamente nas mãos do Estado à sociedade – às pessoas físicas e jurídicas credoras daquelas obrigações.

Além da evidente questão relacionada à justiça – num Estado Democrático de Direito, o poder público não pode se apropriar à margem da lei de recursos dos cidadãos e das empresas –, esse movimento de retorno dos recursos financeiros à sociedade é de extrema relevância para a economia, para os investimentos, para a produtividade nacional. Não há nenhum sentido em literalmente queimar o dinheiro do credor privado – que poderia usá-lo, por exemplo, para empreender ou investir – com campanha eleitoral ou emenda de relator. A PEC dos Precatórios merece ser rejeitada. Além de injusta, vai-se configurando como caminho para uma utilização completamente irracional e contraproducente dos recursos nacionais.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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