Governo ainda não diz para quem e como vai pagar benefícios e corre risco no Congresso
[Vinicius Torres Freire, Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).,em06/11/2021)
O Auxílio Brasil ainda não existe. O dinheiro para pagar o Auxílio Brasil também não. Talvez não exista dindim para bancar a aprovação desse e outros gastos no Congresso. É difícil acreditar que deputados e senadores deixem de aprovar uma renda básica para pobres, faltando menos de um ano para a eleição. Mas o caldo político engrossou, há problemas na Justiça e os prazos para entregar o benefício ao povo miúdo estão quase estourados.
O Auxílio Brasil por ora é apenas uma medida provisória oca. Ali não se diz quanto será pago a cada família, nem exatamente para quais, nem como, afora para aquelas que já estão no Bolsa Família e olhe lá. Faltam poucos dias para definir isso tudo e muito mais.
O Congresso ainda está longe de chancelar a contabilidade criativa e o calote que vão financiar (também) o Auxílio Brasil. Sem isso, dá para pagar benefícios neste ano. Para 2022, só tem dinheiro para bancar o velho Bolsa Família (cerca de R$ 190 mensais para 15,6 milhões, não R$ 400 para 17 milhões, como quer o governo).
Cabalar votos com o dinheiro de emendas parlamentares ficou mais difícil. A ministra Rosa Weber, do Supremo, suspendeu o pagamento das “emendas de relator” (mudanças de destinação de verba do Orçamento definidas pelo parlamentar que redige a proposta final da lei orçamentária. Em geral, beneficiam os escolhidos pelos chefes do centrão).
Na semana que vem, o Supremo deve decidir se barra de vez as “emendas de relator”. Na melhor das hipóteses (para o governismo), a mera indefinição vai dificultar os negócios na Câmara e no Senado, já bastante indócil.
Vai sobrar pouco para emendas parlamentares extras, de relator ou outra mumunha que inventem. Se o Supremo derrubar as “emendas de relator” e se o Congresso não fizer algum acordão de gastos, Jair Bolsonaro terá mais problemas para sustentar a “velha política”.
Se a PEC dos Precatórios não passar ou for amputada de modo essencial, o governo terá de improvisar ainda mais, mais do que fez com o Auxílio Brasil, por incapacidade técnica, negligência e laborfobia. Teria então de pagar algum auxílio para os pobres com créditos extraordinários, o que é em tese ilegal. Sabe-se lá como arrumará dinheiro para bancar o reajuste extra dos benefícios previdenciários etc.
O pessoal do Congresso não nasceu ontem, quase sempre se arruma. A mutreta fiscal, judicial e política está meio liberada. Quase ninguém no sistema de poder quer degolar Bolsonaro na Justiça ou por impeachment, de resto. É verdade que o PIB de 2022 está sendo dissolvido no ácido dos juros da praça financeira, mas Bolsonaro e centrão não estão nem aí. No entanto, aumentou o risco de dar besteira até para a turma da safadagem.