Alta de juros e insegurança semeada pelo governo em cenário já desfavorável freiam planos de expansão de negócios
Ainda que involuntariamente, havia alguma dose de sabedoria na declaração feita pelo presidente Jair Bolsonaro em setembro, de que “não há nada tão ruim que não possa piorar”. É o que se constata quando se avalia a evolução dos investimentos, indispensáveis para o crescimento e a modernização da economia. O clima de incertezas, insegurança e temores alimentado pela trajetória errática de seu governo torna mais preocupante um quadro político e econômico que, por si só, já seria bastante grave para conter ou inibir a disposição dos empresários de investir. Acentua-se, desse modo, o descompasso da economia brasileira em relação à do resto do mundo, o que a condena a ficar ainda mais atrás na corrida pelo desenvolvimento e pela melhora das condições de vida da população.Iniciadas em março para conter, ainda sem resultados visíveis, a aceleração da inflação, as sucessivas elevações da taxa Selic decididas pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central devem atrasar a retomada dos investimentos produtivos, como mostrou reportagem do Estado (14/11). Por causa da política monetária restritiva, empresas vêm optando por preservar o caixa – o que implica reduzir ou adiar investimentos – como garantia em um cenário já enevoado. Dúvidas sobre a evolução da política fiscal, além daquelas sobre os limites para o endurecimento da política de juros, também levam à suspensão, ainda que temporária, de planos de expansão dos negócios.
O Centro de Estudos de Mercado de Capitais (Cemec), vinculado à Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), estima que, na média, o custo do capital subiu de 7,7% em dezembro do ano passado para 10,59% em agosto. Apesar da alta, lembra o coordenador do Cemec, economista Carlos Antonio Rocca, o custo da dívida no Brasil ainda é baixo se comparado com o registrado nos últimos anos.
Mas a alta ocorre no momento em que, com sinais de controle da pandemia, havia a expectativa de que a demanda voltaria a crescer. Aumento do custo do capital é mais um problema para a expansão dos negócios, já afetada pela inflação, altas taxas de desemprego e de trabalho precário e estagnação ou queda da renda dos consumidores. Encarecimento de insumos essenciais, como energia, e dificuldades no suprimento de matérias-primas e componentes são outros fatores que inibem os investimentos. O governo Bolsonaro piora o cenário.
No ano passado, a taxa de investimentos subiu na comparação com 2019. Mas foi apenas um efeito estatístico: o volume de investimentos diminuiu, mas o Produto Interno Bruto (PIB) diminuiu mais, daí a alta de certo modo surpreendente da taxa de investimentos quando a economia se arrastava na crise.
Em 2021, ela continuará baixa, como tem sido nas últimas décadas. O Fundo Monetário Internacional (FMI) estima que, neste ano, a taxa de investimentos no Brasil ficará em 15,4% do PIB, menor do que a de praticamente 90% dos demais países. A média global deve ficar em 26,7% e a das economias emergentes, em 33,2%, mais do dobro da brasileira. Essa estimativa indica que, se a crise é global, a nossa é feita aqui mesmo.