A metódica ruína do ensino público

By | 05/12/2021 7:32 am

Após crise no Inep, governo Bolsonaro agora gera tumulto na Capes, que lida com pós-graduação

A exemplo do que ocorreu com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), a demissão de mais de 50 técnicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (Capes), entre coordenadores, assessores e pesquisadores, evidencia que há um método no desmanche da educação pública no País. A maioria dos demissionários é da área de ciências exatas.

A crise começou a ser gerada no início do governo Bolsonaro, quando os órgãos das áreas de fomento à ciência e ensino superior, como a Capes, que fiscaliza o sistema brasileiro de pós-graduação, passaram a ter seus respectivos orçamentos congelados. Ela aumentou no ano seguinte depois que o então ministro Abraham Weintraub passou a desqualificar as universidades públicas, classificando-as como “locais de baderna e de maconheiros”. Atualmente, 80% dos programas de pós-graduação estão nessas universidades, que são responsáveis por quase toda a pesquisa acadêmica desenvolvida no País.

A crise evoluiu quando, em junho de 2019, ao discursar no XII Congresso Brasileiro de Ensino Superior Particular, Weintraub defendeu o fortalecimento do ensino superior privado, prometeu “mais liberdade para sua atuação” e voltou a criticar o ensino público. Ele deixou o cargo em 2020, mas a equipe de seu sucessor – oriundo de uma universidade presbiteriana – se mostrou simpática a um afrouxamento nas regras de fiscalização da pós-graduação e à adoção de um sistema de autoavaliação e certificação de qualidade expedido por entidades privadas. A tese é defendida há tempos pelas universidades particulares, que acusam a Capes de ser muito rigorosa ao avaliar os cursos de pós-graduação que oferecem.

Em abril de 2021, a presidência da Capes passou a ser exercida por Cláudia Toledo, reitora de um centro universitário particular de Bauru com pouca expressão educacional e científica, cujo curso de mestrado em “sistemas constitucionais” foi descredenciado na última avaliação quadrienal, por ter recebido uma nota baixa. Esse centro, no qual o ministro da Educação se formou, pertence ao pai da reitora. Cinco meses após sua posse, ela destituiu os integrantes do Conselho Técnico-Científico, o órgão responsável pelas avaliações quadrienais, e mudou sem comunicação prévia os parâmetros da avaliação em andamento, o que levou a Justiça a suspendê-la, em caráter liminar.

O pedido de exoneração de mais de 50 assessores e pesquisadores da Capes não causou surpresa. Há meses eles vinham acusando Cláudia Toledo de pressioná-los a liberar uma “expansão desmedida” dos cursos de mestrado integralmente a distância, ignorando os pareceres contrários dos coordenadores de área e consultores do órgão.

Seguindo um roteiro semelhante ao da crise do Inep, a crise da Capes é mais uma implosão – concebida com foco e rigor – de um órgão fundamental do sistema de ensino superior. É com base nesse método que o governo Bolsonaro vem destruindo o que resta do aparato de políticas educacionais que o País construiu, com êxito, nas três últimas décadas.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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