Ex-governador avalia que PSB tem feito muitas exigências para fechar acordo; ideia vem sendo tratada com sigilo entre as partes
Caro leitor,
De saída do PSDB, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin disse a aliados que não quer ser um “peso” para nenhum partido e estuda, agora, a possibilidade de migrar para o Solidariedade, a fim de fazer dobradinha com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2022. Alckmin ainda negocia com o PSB, mas as exigências feitas pela legenda para aceitá-lo como vice na chapa de Lula ao Palácio do Planalto têm provocado mal-estar e desgaste antes mesmo do casamento de papel passado.
A filiação ao Solidariedade surgiu como alternativa em uma conversa de avião e vem sendo tratada com sigilo. Dependendo do cenário, porém, pode acabar se concretizando. Após participar nesta quarta-feira, 8, do encerramento do 9º Congresso da Força Sindical – braço do Solidariedade –, Lula foi questionado por antigos companheiros de sindicalismo, a portas fechadas, se a aliança com Alckmin para 2022 era mesmo um desejo a ser perseguido.
“Ele foi bom governador em São Paulo e compor chapa com ele será bom para o Brasil. Continuem articulando com ele. Eu quero”, respondeu o ex-presidente, de acordo com relatos de três participantes do encontro.
Cinco dias antes, na sexta-feira, 3, Lula havia se reunido com Alckmin na casa do ex-secretário Gabriel Chalita, em São Paulo, com a presença do ex-prefeito Fernando Haddad, pré-candidato do PT ao governo paulista. Em julho, o ex-presidente também trocou figurinhas com o tucano, na casa de Chalita.
O diagnóstico de Lula é de que o Brasil está “no fundo do poço”. O ex-presidente ataca o ministro da Economia, Paulo Guedes, acha que não se pode manter a lei do teto de gastos públicos e defende a emissão de moeda, sob o argumento de que isso é necessário para permitir a criação de empregos e investimentos. Apesar das críticas, porém, mostra muita simpatia pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Interlocutores de Lula e Alckmin garantem que o diálogo entre os dois tem avançado, mesmo quando ocorre por telefone, mas sempre esbarra numa questão: em qual partido o ex-governador vai entrar?
Há um constrangimento por parte de Alckmin. Interessado em ser vice na chapa liderada por Lula, ele tem dito que o PSB jogou à mesa exigências muito difíceis para oferecer o dote. Além disso, não quer se indispor com o amigo Márcio França, presidente do PSB em São Paulo. No grupo do quase ex-tucano, muitos o aconselham a desistir da dobradinha com o PT e disputar o Palácio dos Bandeirantes pelo PSD de Gilberto Kassab.
No último dia 30, quando Lula afirmou à Rádio Gaúcha que estava em “processo de conversar” com Alckmin para montar uma frente de conciliação nacional contra Jair Bolsonaro, todas as imposições feitas pelo PSB ganharam os holofotes. Na lista das condicionantes para fechar o acordo, o PSB quer que o PT apoie candidaturas do partido aos governos de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Acre.
“Eu me encontrei com o Paulinho da Força no voo de São Paulo para Brasília, naquele dia da entrevista do Lula, e falei para ele: ‘O Alckmin está procurando um partido. Por que você não o leva para o Solidariedade?”, contou o deputado Alexandre Padilha (PT-SP) ao Estadão. “Ele achou a proposta boa.”
Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, é presidente do Solidariedade e confirma as sondagens. Chegou até a falar com Lula sobre isso, nesta quarta-feira. “Reafirmei o convite para Alckmin entrar no Solidariedade, com o objetivo de ser candidato a vice do Lula. Se ele quiser, vou trabalhar para isso”, assegurou o deputado. No dia 29, dirigentes da Força Sindical, UGT, CTB e Nova Central já haviam se reunido com o ex-governador para discutir a parceria em 2022.
A cúpula do PT já avisou o PSB que não aceita abrir mão da candidatura de Haddad em São Paulo. O ex-prefeito da capital paulista disputou o segundo turno da eleição de 2018 contra Bolsonaro e, na avaliação dos petistas, tem tudo para derrotar o PSDB do governador João Doria, hoje presidenciável, na corrida ao Bandeirantes.
É importante para Lula ter um palanque forte em São Paulo, o maior colégio eleitoral do País. O publicitário baiano Raul Rabelo, que trabalhou com Haddad, é cotado para ser marqueteiro da campanha de Lula.
Dirigentes do PT que participam das negociações eleitorais afirmam que Márcio França poderia ser vice na chapa de Haddad ou até candidato ao Senado. O PSB, porém, não aceita esse acordo, embora França diga que estende um “tapete vermelho” para o ex-governador se filiar a seu partido.
A entrada de Alckmin como candidato a vice na chapa de Lula também está longe de ser unanimidade no próprio PT. “Para uma campanha aguerrida como a que será a de 2022, vamos ter um anestesista como vice?”, ironizou o deputado Rui Falcão (PT-SP), numa referência à profissão do ex-governador, que é médico anestesista.
Convidado por Lula para integrar a coordenação da pré-campanha, Falcão fez questão de destacar que suas críticas não são de ordem pessoal, mas, sim, políticas. “O que Alckmin vai representar nessa malsinada aliança? O que ele agrega em termos de símbolo e de voto?” perguntou.
Ex-presidente do PT, o deputado contestou interpretações de que o ex-governador daria um tom de moderação à chapa. Lembrou, ainda, que o atual cenário é muito diferente do verificado na campanha de 2002, quando o empresário José Alencar – à época filiado ao PL, hoje com Bolsonaro – fez dobradinha com Lula e acalmou o mercado.
“Lula não precisa mais mostrar nem credibilidade nem experiência”, observou Falcão. “E se Alckmin for vice, ele agora vai ser contra as privatizações?” O secretário de Comunicação do PT, Jilmar Tatto, também mostra resistências a uma chapa de centro-direita. “Não está dado que Alckmin será vice do Lula. Ele poderá ser candidato a governador de São Paulo, e não necessariamente pelo PSB”, previu.
O confronto entre Bolsonaro e o ex-juiz da Lava Jato Sérgio Moro (Podemos) pode favorecer Lula, na visão do comando petista. O raciocínio ali é de que os dois vão acabar “se matando” e a terceira via não tem chance nesse pugilato eleitoral.
Há no PT, ainda, quem veja a possibilidade de Ciro Gomes (PDT), espremido por Moro e estagnado nas pesquisas de intenção de voto, desistir da disputa de 2022, o que abriria caminho para o partido apoiar candidatos do PDT em outros Estados, como no Maranhão. Ciro chama tais comentários de “fake news” e “presepada” e diz que seus adversários não têm ideia de como tirar o País do “atoleiro”.
Do outro lado do tiroteio, o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio (PSDB) afirma que Alckmin deveria pendurar as chuteiras. “Se esse pessoal todo do PSDB que lamenta a saída do Alckmin gosta tanto dele assim, por que o deixou ter 4% dos votos na eleição de 2018 e foi apoiar Bolsonaro?”, provocou Virgílio, derrotado nas prévias do PSDB. Coisas da política.