Orçamento ‘enxuga’ verba social e privilegia projetos eleitorais

By | 22/12/2021 7:18 am

Emendas de relator, que irrigam redutos de parlamentares, reajuste para policiais e fundo para bancar campanhas são a prioridade na divisão da verba

(Adriana Fernandes, nO Estadão, em 22 de dezembro de 2021)

Não foi pelos mais pobres. A aprovação nesta terça-feira, 21, do Orçamento do governo federal no ano eleitoral de 2022 confirmou o roteiro traçado quando o presidente Jair Bolsonaro e os líderes do Congresso acertaram, há exatos dois meses, “pedalar” o pagamento de precatórios (dívidas reconhecidas pela Justiça) e quebrar o teto de gastos – a principal âncora de sustentabilidade das contas públicas do País.

A “licença para gastar” com a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) garantiu R$ 113 bilhões extras de despesas no Orçamento de 2022, mais do que o dobro dos R$ 54 bilhões que serão usados para aumentar o orçamento inicial de R$ 35 bilhões do novo programa social, o Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família.

Câmara dos Deputados
Votação do projeto de lei orçamentária no plenário da Câmara; despesas na área social preteridas. Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Foi uma votação do Orçamento sem freios. Na reta final, os deputados e senadores carimbaram R$ 16,5 bilhões de emendas de relator do chamado “orçamento secreto”, revelado pelo Estadão, para enviar para as suas bases regionais gastarem em obras na maioria das vezes paroquiais e eleitoreiras.

Os partidos também encheram o fundo eleitoral com mais R$ 4,9 bilhões para serem usados na campanha do ano que vem. A “disputa” por um fundo de R$ 5,7 bilhões, que travou a votação do Orçamento na segunda-feira, se mostrou mais um “bode na sala” como estratégia para os parlamentares dizerem que recuaram, diminuindo o valor do aporte em nome de mais recursos para outras áreas como saúde e educação. Teatro bem ensaiado com o apoio em peso dos parlamentares e do governo. Todos de olho nas eleições.

De quebra, o presidente Bolsonaro conseguiu R$ 1,7 bilhão para os policiais, provocando uma reação nas outras carreiras que ficaram sem reajuste. Os auditores fiscais da Receita, categoria com grande poder de pressão de parar aeroportos e portos e fazer “operação tartaruga” na hora de arrecadar, já ameaçaram paralisações e entrega de cargos.

Uma crise em cascata no funcionalismo já está contratada com a decisão do Congresso de privilegiar apenas uma categoria, de acordo com alerta da própria equipe econômica. A concessão de outros aumentos já é dada como certa não só no Executivo, mas, sobretudo, no Judiciário, que, com as mudanças no teto, ganhou também margem para gastar.

“A caixa de Pandora foi aberta”, resumiu o economista Felipe Salto, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, o primeiro a mostrar com números que o furo no teto seria superior ao valor que o governo estava apontando, de R$ 106 bilhões. E o valor poderá ser ainda maior e chegar a R$ 118 bilhões a depender da inflação em 2021.

A estratégia do Ministério da Economia para evitar a farra de gastos foi inflar a previsão de despesas obrigatórias (com abono e benefícios da Previdência). Não deu certo. O Congresso fez a conta e viu que os números estavam mais altos. Como resposta, o Congresso cortou R$ 16,5 bilhões de subsídios, Previdência, BPC (benefício para idosos e pessoas com deficiência de baixa renda) e pessoal.

Uma prova de que a vinculação de recursos da PEC a programas sociais não funcionou. Se fosse assim, essa “sobra” teria de ter ido para reforçar o Auxílio Brasil, que não vai acabar com as filas de famílias que esperam pelo benefício porque os senadores votaram contra.

O argumento usado para mudar as regras fiscais e dar um calote nos precatórios foi de que era preciso combater o aumento da pobreza, garantindo um auxílio de R$ 400. Mas a votação da terça-feira escancarou como os interesses paroquiais do Congresso e do governo se sobressaem na divisão dos recursos públicos.

A fotografia que melhor retrata a atual desorganização orçamentária é a do presidente Jair Bolsonaro, de férias, dançando funk numa lancha no litoral de São Paulo ao mesmo tempo que o Congresso fazia as últimas negociações para aprovar o Orçamento do último ano do seu governo. / COLABOROU DANIEL WETERMAN

Prioridades

O que foi preterido

Gastos sociais

Mesmo com o Auxílio Brasil de R$ 400, o gasto do governo Bolsonaro com transferência de renda será menor em 2022 em relação a 2021: são R$ 7 bilhões a menos e 22 milhões de famílias que ficarão sem proteção na pandemia.

Obras

O patamar de investimentos será o menor da história em 2022. Serão R$ 44 bilhões para infraestrutura, escolas, postos de saúde, defesa e em todas as áreas que dependem de recursos da União.

Vacinas

Parlamentares ligados à Saúde pediram R$ 5 bilhões a mais para a compra de imunizantes no ano que vem, mas o valor não foi incluído no relatório final do Orçamento.

Defesa Civil

A previsão de recursos é a menor dos últimos anos. Serão R$ 504 milhões destinados à área responsável pela preparação do País para enfrentar eventos climáticos extremos, como enchentes.

Aumento para servidores

O presidente Jair Bolsonaro prometeu reajuste para todos os servidores em 2022, mas incluiu apenas aumento salarial para carreiras policiais.

O que foi privilegiado

Campanhas políticas

Partidos terão o maior volume de dinheiro público da história para financiar campanhas em 2022. Serão R$ 4,9 bilhões, além de R$ 1,1 bilhão de outro fundo público.

Orçamento secreto

Em 2022, serão mais R$ 16,5 bilhões repassados a redutos políticos de deputados e senadores alinhados ao governo, sem critérios claros e com pouca transparência.

Aumento para policiais

Congresso reservou R$ 1,7 bilhão para bancar o reajuste salarial a policiais federais. O plano prevê reestruturação de carreiras da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen).

Novos cargos públicos

Além do dinheiro para o reajuste a policiais, o governo terá R$ 2,8 bilhões para a criação de cargos e a ocupação de novas vagas na administração federal, em ano eleitoral.

Aviões militares

O ministério que receberá a maior parte dos investimentos para 2022 será o da Defesa. Só para compra de aeronaves e caças da FAB, por exemplo, está reservado R$ 1,2 bilhão, valor maior que todo o montante previsto para ser gasto em saneamento básico (R$ 1 bilhão) no próximo ano.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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