Congresso controla mais de 50% dos investimentos do Orçamento

By | 26/12/2021 7:58 am

Número indica desequilíbrio do presidencialismo; analistas dizem que presidente eleito enfrentará ‘guerra de vida ou morte’ pelo controle de recursos

(Marcelo Godoy, nO Estadão, 26 de dezembro de 2021)

A verdadeira “guerra” em torno da execução das emendas parlamentares ao Orçamento vai selar o destino do futuro governo e terá mais importância e efeito para os custos da governabilidade do que as federações partidárias e outras novidades da legislação eleitoral, como o fim das coligações nas eleições proporcionais.

Esta análise, feita por líderes políticos e cientistas políticos, joga luz na mais forte ponta da crise do presidencialismo de coalizão, modelo que, desde a redemocratização, tradicionalmente rege a relação entre Executivo e Congresso no País. Para especialistas, essa correlação de forças, essencial para a governabilidade, ficou comprometida na gestão Jair Bolsonaro, que se rendeu a um “presidencialismo de cooptação” – no qual o Congresso se tornou responsável por metade dos investimentos do Executivo, sem se comprometer com políticas públicas do governo ou com a responsabilidade fiscal.

Em números, essa situação é descrita pela evolução da execução orçamentária das emendas parlamentares, que saiu de R$3,3 bilhões empenhados em 2015 para chegar a R$ 26,5 bilhões em 2021. Em 2022, o orçamento federal prevê R$ 44 bilhões para investimentos e R$ 21,1 bilhões para atender a emendas de parlamentares.

 

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Plenário do Senado: Congresso influencia muito nas emendas, com pouca responsabilidade nos resultado Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

“O próximo presidente vai experimentar um primeiro ano infernal em sua relação com o Congresso. Será uma batalha de vida ou morte para saber quem vai controlar a execução do orçamento”, disse Alessandro Molon (PSB), líder da oposição na Câmara. Para ele, esta “guerra” passa pelo fim do orçamento secreto – revelado pelo Estadão, que tem como base as emendas de relator – e definirá o sucesso ou insucesso do futuro governo.

Conforme cálculo do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), as emendas parlamentares consumiram, em 2021, 53% do total de R$ 50 bilhões de investimentos do governo federal. “Mais da metade do orçamento de investimento é de emendas parlamentares individuais, de bancada, de comissão ou de relator. Em 2015, isso não era assim.”

Para ele, o País precisa enfrentar essa situação. “Num sistema presidencialista é complicado ter um  orçamento  parlamentarista.” Segundo Moreira, o Congresso está influenciando muito o Orçamento com pouca responsabilidade nos resultados políticos do governo. “Por mais que você faça uma coalizão, ela servirá apenas para se manter no poder e não para melhorar a qualidade do governo.”

Molon concorda com o colega tucano. Para ele, o orçamento secreto – só as emendas de relator em 2022 somarão R$ 16,5 bilhões – transfere, na prática, do Executivo para o Legislativo, a execução desses recursos. Além da falta de transparência na aplicação das verbas, os critérios de decisão são desconhecidos. “Isso não é republicano, legal ou moral. É impossível construir um País desse jeito.”

Categorias

Para o presidente do MDB, deputado federal Baleia Rossi (SP), o orçamento secreto cria deputados de primeira, segunda e terceira categoria. “Não sou contra as emendas, pelo contrário, eu represento minha base eleitoral; muitas das ações na área da saúde dependem dessas emendas, mas o orçamento secreto está criando uma série de distorções ruins para a democracia.”

Segundo o emedebista, as emendas são usadas para influenciar votações, o que afeta a discussão de questões fundamentais para o País , o que desestrutura os partidos. “É natural que o deputado da base tenha mais participação na indicação de projetos estruturais do governo. Mas o que está acontecendo é muito ruim, pois faz com que os partidos não tenham mais o controle do debate sobre temas.”

Baleia também prevê que o próximo presidente terá de enfrentar o tema. A solução, diz, pode ser o aumento das emendas impositivas individuais, “que são transparentes e chegam à base de todos os Estados”.

Líder do PT na Câmara, o deputado Bohn Gass (RS) afirma que o “Parlamento deve fiscalizar os recursos e votar o Orçamento, mas cabe ao Executivo administrar o País”. “Não estamos no regime parlamentarista. Por isso acreditamos que esse mecanismo não está correto”, disse. “Temos de rever isso.”

Custo

Além da execução orçamentária, outros fatores, como a fragmentação partidária no Parlamento – que atualmente abriga 24 partidos –, também elevam o que os analistas costumam chamar de custo da governabilidade. Para o cientista político Humberto Dantas, a figura do presidente da República também desempenha um papel importante nesse cálculo.

“As características do presidente, o fato de ele ser o Bolsonaro, o Temer ou a Dilma Rousseff muda inteiramente a questão da governabilidade. A intensidade e agressividade de Bolsonaro e a capacidade e forma como ele negocia a governabilidade explicam muito o quadro que estamos vivendo”, afirmou Dantas.

Para Molon, o País vive um “semipresidencialismo disfarçado para tentar poupar o que resta de apoio a um presidente decadente”. “É um presidente que não governa, não decide sobre os recursos e transforma todas as votações em ‘toma lá, dá cá’. Não se discute mais projeto. A política virou um varejo das emendas individuais. É um desastre, o pior dos mundos; não é o presidencialismo nem o parlamentarismo. É essa feira, em que cada um tem direito a uma quantidade de emendas. Isso não tem como dar certo.”

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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