Bolsonaros e Garotinhos

By | 06/02/2022 5:57 am

A união dos clãs Bolsonaro e Garotinho faz todo sentido. Ambos concebem a política como um negócio familiar

O presidente Jair Bolsonaro foi ao Rio de Janeiro se encontrar com os ex-governadores Anthony e Rosinha Garotinho em busca de apoio à sua campanha pela reeleição. Fossem tempos normais, e fosse o próprio presidente alguém imbuído de espírito público e afeito à dignidade do cargo, seria de questionar a conveniência de obter o apoio do notório casal. Afinal, entre as maiores realizações do casal Garotinho estão o agravamento da degradação da política fluminense e sua entrada no seleto rol de ex-governadores que conheceram as paredes internas do sistema penitenciário do Estado na condição de custodiados.

Mas trata-se de Jair Bolsonaro, a mesma pessoa que não viu problemas em se filiar a um partido político comandado por um condenado por corrupção pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que também já amargou um período na cadeia. O presidente, pois, não é dado a esse tipo de melindre, além de ter padrões morais elásticos o bastante para acomodar os interesses do seu clã entre essas, digamos, inconveniências.

Com a reeleição ameaçada, Bolsonaro recorreu ao casal Garotinho, muito ligado a grupos evangélicos no Estado, como tática para tentar ao menos estancar a rejeição a seu nome. Aos ex-governadores, convém deixar claro, também é conveniente barganhar com o presidente da República para manter o que ainda resta de poder à família em um naco do território fluminense, sobretudo após as trevosas passagens de Anthony e Rosinha Garotinho pelo Palácio Guanabara e o desgaste provocado por seus dias de cárcere.

Informalmente, esse encontro dos clãs Bolsonaro e Garotinho foi considerado o “marco inicial” da campanha pela reeleição do presidente no Estado, com direito a discursos no Porto do Açu, no norte fluminense – espécie de enclave dominado pela família Garotinho há anos –, e ataques aos adversários, malgrado o ato apresentar todos os elementos de uma campanha antecipada à luz da lei eleitoral, só faltando o pedido explícito de votos. Mas aí seria demais.

Dado o retrospecto dos cabeças de dois dos mais parasitários clãs políticos da história do País, é possível afirmar que o melhor interesse público não foi nem de longe o assunto principal da conversa. Bolsonaro, o casal Garotinho e os filhos deste trataram, primordialmente, das condições de sobrevivência política das duas famílias, transformadas em holdings que administram as carreiras políticas de vários de seus membros e associados. No encontro com Bolsonaro, Anthony e Rosinha Garotinho estavam acompanhados pela deputada federal Clarissa Garotinho (PROS) e pelo prefeito de Campos dos Goytacazes, Wladimir Garotinho (PSD), filhos do casal.

A união das famílias faz todo sentido, haja vista que há mais fatores em comum entre Bolsonaros e Garotinhos do que a mera proximidade geográfica de seus redutos eleitorais. Ambos os clãs concebem a política como um empreendimento particular, sobretudo familiar. Em primeiro lugar, estão sempre os interesses familiares. Tanto faz se estes eventualmente coincidem com o interesse público. Quando não coincidem, azar da sociedade. Bolsonaro e Garotinho são casos muito bem delineados da política exercida não como vocação, nem tampouco orientada para o interesse público, mas como um meio de vida em que prevalece a manutenção do fluxo de caixa da família à custa do Estado, por meio do lançamento sucessivo de candidaturas a cada geração que não têm outro objetivo que não a perpetuação do modelo.

Há 20 anos, Bolsonaro declarou ao jornal O Globo que seu plano era “sarneyzar” o Rio, aludindo ao domínio da família Sarney no Maranhão. “Além de Carlos, de 19 anos, que já é vereador, agora pretendo ter o Flávio, de 21 anos, na Assembleia Legislativa”, disse o então deputado federal Jair Bolsonaro. “O Eduardo, de 18 anos, por enquanto ainda está na ‘suplência’. Meu quarto filho, de 4 anos, é o mais perfeito: chama-se Jair (Renan) e é boa-pinta.”

O destino político da pequena Laura, caçula do presidente, talvez só não esteja traçado ainda porque Bolsonaro considera as mulheres seres inferiores. O presidente atribui o nascimento da menina a uma de suas “fraquejadas”.

Comentário

Category: Últimas

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *