Por que evangélicos bolsonaristas estão inquietos?

By | 16/02/2022 10:36 am

O presidente pode ter colecionado erros ao longo do mandato, mas sua atitude em relação aos cristãos foi impecável

Juliano Spyer, Antropólogo, pesquisador do Cecons/UFRJ, autor de Povo de Deus (Geração 2020) e criador do Observatório Evangélico,

 

 

Juliano SpyerAssim como Lula se tornou o herói da “classe C”, Bolsonaro se tornou o messias do cristão conservador. Foi uma estratégia visionária considerando que o Brasil está em vias de se tornar um país protestante e que a esquerda nunca fará o mesmo aceno a religiosos conservadores sem soar oportunista.

O presidente pode ter colecionado erros ao longo do mandato, mas sua atitude em relação aos cristãos foi impecável. A começar pela campanha vitoriosa de 2018 cujo slogan “Deus acima de todos” sinalizava seu compromisso com os valores da família tradicional e impôs à mídia secular, que historicamente desdenha o evangélico, falar sobre religião.

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) participa de culto na Igreja Batista Atitude ao lado da esposa, Michelle Bolsonaro, no Rio de Janeiro, em novembro de 2018 – Fernando Frazão – 4.nov.2018/Agência Brasil

O cientista político Victor Araújo, especialista no tema, explicou a posição privilegiada do presidente: “Bolsonaro conseguiu a proeza de juntar todos [os pastores e lideranças evangélicos]… [Foi quem] ofereceu mais benefícios fiscais, e também deu acesso para eles frequentarem espaços que nunca frequentaram antes. O governo Bolsonaro os tratou com uma deferência sem paralelo.” (Observatório Evangélico, 01/02)

Bolsonaro não é o candidato dos sonhos dos evangélicos, a começar porque ele mesmo não é evangélico, não demonstra ter interesse especial pela leitura da Bíblia e tem uma postura deselegante que não condiz com o comportamento promovido nas igrejas. Ele defende a facilitação da compra de armas, algo que a evangélica moradora da periferia tem horror de ouvir falar.

O jogo intricado de forças dentro das igrejas inclui ainda a postura do jovem evangélico, que hoje é menos subordinado às hierarquias pelo convívio nas universidades e pelo acesso a variedades de argumentos teológicos disponíveis online. Também a percepção de que a influência política conquistada pelo cristianismo não recuará com a eventual derrota de Bolsonaro. E uma frustração entre muitos protestantes, resumida pelo diretor da Aliança Evangelica Brasileira, Cassiano Luz: “não é papel da igreja promover candidatos a cargos políticos.”

Os ataques a Moro e Lula sinalizam a percepção de que Bolsonaro corre um risco maior do que o de ser derrotado nas urnas: o de terminar a campanha menor do que entrou. Por causa disso, pastores midiáticos como André Valadão da Lagoinha Church estão explicitando seu apoio ao clã Bolsonaro —e se expondo a críticas— abrindo seus púlpitos e canais de mídia à pregação abertamente política de quem reforça o mote “cristão não vota na esquerda”.

Lula disputará com Bolsonaro o voto dos evangélicos pobres, que hoje vivenciam em suas comunidades desemprego, queda de renda e aumento da insegurança alimentar. Ele tem a seu favor a memória dos tempos de prosperidade e agora a ajuda do pastor pentecostal Paulo Marcelo que, conforme explicou o pastor Kenner Terra, tem acesso ao “chão de fábrica” pentecostal.

Mas há outro foco de incêndio para o presidente: o aumento do apoio —ainda discreto mas perigoso— de evangélicos ao ex-ministro Sérgio Moro, uma alternativa que não cabe na etiqueta de “candidato de esquerda”.

Moro traz para a disputa uma narrativa atraente para o eleitor evangélico: a do justiceiro perseguido. O defensor obstinado da lei e da ordem. E apesar do ex-ministro não abraçar a pauta conservadora com a convicção do presidente, ele encarna aquilo que ajudou Bolsonaro a ser eleito: a bandeira do combate à corrupção.

Há, portanto, motivos para a guerrilha bolsonarista estar atuando no território que, supostamente, é a fortaleza do presidente.

Se a debandada não for condida, a explicitação da simpatia do evangélico antipetista por Moro escancarará a fragilidade de Bolsonaro como gestor que dificultou a campanha de vacinação contra o Covid, aprofundou a crise econômica do país, recorre à desinformação para se promover e, ao contrário da promessa veemente de campanha, hoje dificulta o combate à corrupção no país.

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Category: Nacionais

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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