O triunfo definitivo do Centrão

By | 21/02/2022 6:57 am

Lira deixa claro que anemia da cadeira presidencial é fato consumado e que o próximo presidente terá de se submeter ao Congresso

Se foi malsucedido em implantar uma agenda conservadora como a prometida na campanha de 2018, Jair Bolsonaro pode se vangloriar de ter subvertido o presidencialismo de coalizão vigente no País desde a redemocratização. Na atual administração, o governo não governa, não define os projetos que serão submetidos ao Legislativo e não articula maioria no Congresso. Essas atividades foram gentilmente cedidas a Arthur Lira (PP-AL), que assumiu as funções como se tivesse sido ele, e não Bolsonaro, o eleito com o voto de 57,7 milhões de brasileiros para comandar o Orçamento e liderar o debate legislativo. É sempre necessário lembrar que não foi, ainda que uma recente entrevista de Lira ao jornal Valor Econômico explicite esse e vários outros aspectos da realidade política do País supostamente presidido por Bolsonaro. A bem da verdade, a cadeira presidencial já vinha sendo enfraquecida antes, ainda sob Dilma Rousseff, mas o processo se acentuou ainda mais com Bolsonaro, cujo único objetivo desde que foi eleito é garantir mais quatro anos no cargo.

Está cada vez mais evidente que caberá a Lira dar uma solução para o pandemônio que se tornou a discussão sobre a desoneração de combustíveis, obsessão bolsonarista e alvo de pelo menos duas Propostas de Emenda à Constituição (PEC), uma delas apelidada de PEC Camicase pelo impacto estimado de R$ 100 bilhões aos cofres públicos. Se depender do presidente da Câmara – e já se sabe que depende –, o Congresso deixará as bombas fiscais de lado e aprovará um projeto de lei complementar que muda a cobrança de ICMS, hoje um porcentual sobre o preço, para um valor fixo por litro, e aproveitará a proposta para embutir no texto a redução dos impostos federais sobre o diesel. “Não temos interesse nenhum em atrapalhar o caminho involutivo que o dólar está tendo e que a inflação terá”, disse Lira.

É, portanto, com o espírito público de Lira – dono do orçamento secreto e articulador da PEC dos Precatórios, aquela que dinamitou o teto de gastos – que o País precisa contar para evitar a explosão da inflação e a desvalorização do câmbio, enquanto o Banco Central luta praticamente sozinho para manter alguma estabilidade na economia. O ex-superministro Paulo Guedes, por sua vez, “é como ele é, todo mundo sabe como ele é”, na precisa definição de Lira, e deveria seguir a hierarquia – o que, neste governo, significa um presidente decorativo tutelado pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira. “As pessoas me perguntam se houve uma superposição do ministro Ciro sobre o ministro Guedes. Não. Todo governo tem que ter uma hierarquização. O presidente da República, o ministro da Casa Civil e depois os outros ministros. Se o ministro da Casa Civil não organizar o Ministério, fica ruim. Tem que ter quem fale pelo governo. O ministro da Economia tem que ser ouvido, é figura-chave com relação aos projetos econômicos, mas ele não pode ter a palavra final se o governo vai querer fazer política de saneamento. Isso aí é governo. Ele pode falar sobre o impacto e o governo tem a posição política de enfrentar ou não”, disse.

Não que surpreenda, mas chama a atenção uma exposição tão nua da natureza distorcida das relações entre Executivo e Legislativo. Lira deixa claro que a anemia da cadeira presidencial é hoje um fato da vida, e se as consequências desse fato serão boas ou ruins para a sociedade é o comando do Congresso quem vai dizer. Nesse sentido, o principal recado de Lira, que já reconheceu a iminente derrota de Bolsonaro ao menos no Nordeste, foi para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Líder das pesquisas de intenção de voto, Lula já anunciou que pretende revogar a reforma trabalhista e as privatizações de estatais e subsidiárias se for eleito. “Só queria lembrar que no meio dos presidentes que estão e que serão eleitos tem o Congresso Nacional. E já deixei bem claro: permanecendo um Congresso de centro-direita, nossa vontade é não retroagir nos avanços que a gente já teve. O problema do Brasil é terminar as reformas paradas.” Traduzindo: o presidente da República pode até mudar, mas Lira fica, e o Centrão também.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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