STF tem razão. Fundo eleitoral é imoral, mas não é ilegal!

By | 05/03/2022 6:13 am

STF não é revisor do Congresso

Fundo Eleitoral é uma aberração, mas a decisão do STF de respeitar a opção do Congresso foi correta. Democracia não combina com judicialização da política

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de manter a validade das regras de cálculo do valor do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, o chamado Fundo Eleitoral, tem uma importante dimensão pedagógica. Ainda que a maioria dos ministros da Corte tenha manifestado discordância pessoal em relação ao valor de R$ 4,9 bilhões destinado ao fundo, o plenário do STF respeitou a decisão legislativa, em deferência ao princípio da separação dos Poderes. É o Congresso, e não o Judiciário, que define a legislação orçamentária.

A missão do STF é defender a Constituição. Cabe à Corte, portanto, entre outras atribuições, realizar o controle de constitucionalidade das leis aprovadas pelo Congresso. Se uma lei contraria o texto constitucional, ela deve ser retirada do ordenamento jurídico. Caso contrário, haveria uma inversão hierárquica de normas, com uma lei prevalecendo sobre a Constituição, o que é um evidente contrassenso.

O controle de constitucionalidade do STF sobre os atos do Legislativo e do Executivo não é, no entanto, uma autorização para que o Judiciário faça uma avaliação política desses atos. A Justiça não revisa politicamente as decisões do Congresso, por mais equivocadas que possam ser. Sendo constitucionais, as opções legislativas devem ser respeitadas. “O valor (do Fundo Eleitoral) é alto, mas inconstitucionalidade aqui não há”, disse o presidente do STF, ministro Luiz Fux.

Se a existência do Fundo Eleitoral em si já é imoral, mais imoral ainda é seu bilionário valor, que cresce exponencialmente a cada eleição. Com pessoas passando fome, com necessidades prementes em áreas essenciais, como educação e saúde, Senado e Câmara destinaram inacreditáveis R$ 4,9 bilhões dos cofres públicos para os partidos políticos realizarem as campanhas de seus candidatos. Eis a total disfuncionalidade.

Um fundo que nem deveria existir, pois desvirtua a representação política, recebeu um valor superior ao orçamento de 99,8% dos municípios brasileiros, segundo levantamento do Estadão. Trata-se de cabal deboche com a população e com o País. No entanto, por mais contundente que seja o erro do Congresso, o Supremo não está autorizado a mudar o valor do fundo. Em um Estado Democrático de Direito, com vigência do princípio da separação de Poderes, o orçamento público é uma decisão dos parlamentares eleitos, que respondem politicamente por essa decisão.

Ao rejeitar a judicialização da política, mantendo o valor do Fundo Eleitoral, o Supremo não disse que a decisão do Congresso foi correta ou condizente com o interesse público. Apenas reconheceu que o Judiciário não é órgão revisor do Legislativo. Erros políticos devem ser corrigidos pela política, no âmbito político. Em última análise, é o eleitor, no exercício de seus direitos políticos, quem tem a responsabilidade de fazer o controle político das decisões do Congresso.

Vale notar que a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 7058, questionando o valor do Fundo Eleitoral, foi ajuizada pelo Partido Novo, que tentou reverter no Judiciário a derrota sofrida no Legislativo. Como enfatizou corretamente o presidente do STF, ministro Luiz Fux, os inconformados com derrotas na arena política acreditam que podem revertê-las apelando ao Supremo. O fenômeno da judicialização da política não é, portanto, mero fruto do ativismo de alguns membros do Judiciário. São os próprios partidos que, contrariando o princípio democrático, recorrem ao Supremo com o objetivo de alterar a decisão da maioria dos parlamentares.

Felizmente, por 9 votos a 2, o Supremo rejeitou a manobra, abstendo-se de intervir na decisão do Congresso. Não deixa de ser curioso que o novo ministro do STF, André Mendonça, indicado por Jair Bolsonaro – que continuamente critica a suposta interferência do Supremo sobre os outros Poderes –, tenha sido um dos dois a defender a alteração da decisão política do Legislativo.

Fundo Eleitoral de R$ 4,9 bilhões é uma aberração, mas a decisão do Supremo foi correta. No regime democrático, decisão política equivocada não é corrigida pela caneta de juiz, mas pelo voto do eleitor. Sem admitir atalhos cômodos, “todo o poder emana do povo” tem consequências exigentes.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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