Quem disser que uma empresa pode ignorar decisões judiciais, quer a anarquia
O purismo na defesa de um valor presta um desserviço à concretização desse valor no mundo real. Vejo liberais indignados com a decisão de Alexandre de Moraes de suspender o Telegram. Dizem que é censura, que um aplicativo de mensagens usado por tantos milhões de brasileiros não pode ser simplesmente suspenso só porque alguns o utilizam para crimes.
É inegável que o país todo sairia perdendo se o aplicativo de mensagens e listas de transmissão fosse banido. Para ficar num exemplo, lembrado por Jorge Pontual na Globo News, grande parte das informações sobre a guerra na Ucrânia chegam a nós via Telegram.
A maioria das plataformas já toma medidas pró-ativas para combater desinformação e atividades criminosas. Já com o Telegram, a cooperação era zero. Chamados do TSE para colaborarem no combate à desinformação eleitoral, e mesmo decisões judiciais de bloqueio de contas e fornecimento de informações, foram ignorados reiteradamente. Em outros países, a mesma coisa: ignorou solenemente os pedidos da Justiça alemã para colaborar no combate a grupos neonazistas.
Uma empresa deve ter o direito de ignorar decisões judiciais brasileiras e continuar a operar livremente em nosso país? Quem disser que sim, quer a anarquia. Moraes poderia ter ido aos poucos, cobrando multas progressivas antes de partir para o tudo ou nada? Talvez. Multar usuários que furassem o bloqueio em 100 mil reais seria um absurdo? Sem dúvida. O fato é que ele optou, como de costume, pelo jogo duro.
O Telegram é pequeno se comparado a outras plataformas. Conforme revelado na pesquisa BTG-Pactual desta segunda-feira (21), apenas 7% dos entrevistados usam o aplicativo para se informar sobre política (compare isso com os 42% do Youtube e 39% do Facebook). No entanto, é nele que se encontram os grupos mais radicalizados, gerando e consumindo conteúdo extremista que seria rapidamente derrubado em outras plataformas.
De uma coisa podemos ter a mais tranquila certeza: caso perca as eleições, Bolsonaro tentará desacreditar as urnas e causar tumulto, numa reedição da Invasão do Capitólio americano em janeiro de 2021. O Telegram é a ferramenta mais provável dessa mobilização. Quando e se ela acontecer, Justiça e empresa terão que agir rapidamente para defender nossa liberdade. A julgar pelo desenrolar deste fim de semana, estamos preparados.