Possibilidade é prevista na Lei Maria da Penha e válida para cidades que não sejam sede de comarca
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quarta-feira (23) que é possível que autoridades policiais, como delegados, retirem da residência o potencial agressor de uma mulher que esteja sob risco de violência doméstica ou familiar.
Por unanimidade, os ministros entenderam que adendos à Lei Maria da Penha aprovados pelo Congresso em 2019 são constitucionais. Esses trechos dizem que, em cidades que não sejam sede de comarca do Judiciário, o delegado pode retirar o agressor da residência. Quando não há delegado, isso pode ser feito por um policial.
Isso pode acontecer caso esse risco for à vida ou à integridade física ou psicológica da vítima ou de seus dependentes.
A AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) questionou a alteração na Maria da Penha, sob o argumento de que a mudança criou um “estado policialesco”.
“Não se pode cogitar da possibilidade de um policial ou delegado vir a ‘penetrar’ no ‘lar, domicilio ou local de convivência’, sem ordem judicial, para retirar alguém do ambiente e ainda mantê-lo afastado, privando-o da sua liberdade, antes do devido processo legal”, disse a AMB em seu pedido ao STF.
O relator, ministro Alexandre de Moraes, votou de forma contrária ao entendimento da associação e afirmou que não há problema na atuação do delegado nesses casos. Ele disse que mais da metade dos municípios do país não é sede de comarca.
“A lei é de 2019 e nós estamos em 2022. Me parece que o Brasil não se tornou um estado policialesco em virtude dessa lei. O tempo é o melhor argumento em relação a isso”, afirmou Moraes. “Não há nenhuma base fática para dizer que isso possa ocorrer.”
Moraes foi seguido por André Mendonça, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Kassio Nunes Marques, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Luiz Fux.
“Acho que o que nós precisamos é, em vez de diminuir as atribuições das autoridades administrativas —neste caso os delegados e os policiais, na falta de delegados—, aumentar a presença de juízes dentro do Brasil”, afirmou a ministra.
Antes da votação, a AMB havia dito, por meio do advogado Alberto Pavie Ribeiro, que as inovações no Judiciário permitem que o juiz seja acionado, mesmo à distância.
“A alteração legislativa se deu em 2019, quando já havia previsão legal de acionamento dos juízes em situação de urgência ou em plantão por videoconferência e de forma virtual. Veio a pandemia e o Poder Judiciário se aparelhou imensamente para prestar jurisdição à distância, sem a presença física do magistrado”, disse.
“Se em 2019 já não havia necessidade de a lei atribuir uma competência absoluta do Poder Judiciário a agentes do Poder Executivo, que dirá agora em 2022.”
Já a AGU (Advocacia-Geral da União), em seus argumentos, se manifestou de forma contrária à AMB.
“A nova lei faz parte de uma necessária e fundamental complementação da Lei Maria da Penha, continuando a dar efetividade aos compromissos assumidos pelo Estado brasileiro, no âmbito nacional e internacional”, disse Bruno Bianco, advogado-geral da União.
O PGR (Procuradoria-Geral da República), Augusto Aras, defendeu a posição da AMB e disse que a legislação invade a atuação do Poder Judiciário.