Pesquisa não pode ser decisiva na definição de candidaturas. Importa a capacidade de estimular a esperança com propostas sólidas para os problemas do presente e as ambições do futuro
Há uma clara inversão de valores aqui. O que dá solidez a uma candidatura, sobretudo uma candidatura que se propõe a enfrentar a demagogia de Lula da Silva e Jair Bolsonaro, é a capacidade do postulante e de seu partido de se apresentarem ao eleitorado como veículos de um projeto concreto de país. É isso que tem potencial de atrair votos. Ao definir uma candidatura não por sua substância programática, ora inexistente, mas apenas pelo grau de rejeição dos nomes apresentados, a “terceira via” parece estar disputando não a chefia do governo, mas o lugar de maior destaque na prateleira de um supermercado.
É óbvio que política envolve carisma, isto é, a qualidade extraordinária de transpirar poder. Logo, nem a mais sofisticada das plataformas eleitorais é suficiente para vencer uma eleição se o candidato que a propõe não inspirar essa força nos eleitores. No entanto, um candidato escolhido somente por ser supostamente mais bem aceito que outros em enquetes, e não por suas ideias ou propostas, tende a ser apenas mais um enlatado na gôndola. Pode até ganhar a eleição, mas empobrece a política e, por tabela, a democracia.
Hoje, infelizmente, os partidos são apenas veículos das ambições pessoais de seus donos ou caciques. Votar neste ou naquele partido faz pouca ou nenhuma diferença para os eleitores, que são convidados não a pensar nos grandes problemas nacionais, mas somente no atendimento imediato – e invariavelmente precário – de suas necessidades. É por isso que os dois líderes das pesquisas de intenção de voto para presidente sejam rematados irresponsáveis, a prometer unguentos mágicos para solucionar problemas que demandam remédios bem mais amargos.
É fundamental que haja entre os postulantes à Presidência uma candidata ou um candidato que represente genuinamente os valores da democracia liberal, especialmente nesta quadra histórica, marcada pelo que o sociólogo Larry Diamond, da Universidade Stanford, chamou de “recessão democrática”, a ascensão de líderes autoritários em diversos países mundo afora. Ou bem se constrói uma candidatura com esse propósito claro, disposta a disputar votos sem abrir mão de convicções liberais nem fazer concessões a demandas estranhas à livre-iniciativa e às liberdades, ou não restará aos brasileiros alternativa senão ter que escolher o “mal menor” entre candidaturas retrógradas. Não é assim que se faz um país.
Não se pode criticar o cidadão verdadeiramente democrata que olhe para o quadro político-eleitoral de momento e não seja tomado por um misto de frustração e desalento. Até aqui, em instante algum se viu os partidos do centro democrático discutindo propostas concretas para tirar o País do atoleiro político, econômico, social e moral em que se encontra há muito tempo. Fala-se muito em impedir que o futuro do Brasil continue condicionado aos desvarios de um presidente demagogo, seja de que partido for. De fato, seria um desastre de consequências funestas.
Mas o que oferecer ao eleitor no lugar da gritaria iliberal bolsonarista ou do retrocesso estatólatra do lulopetismo? As possíveis candidaturas alternativas até agora postas não deram uma resposta sólida a essa questão. Pelo contrário: perdem tempo e energia digladiando-se em público, pensando unicamente em meios de ganhar a eleição, e não em articular e defender projetos, com confiança e honestidade. É legítimo que todo partido almeje o poder, mas, antes disso, deve ter claro e dizer a todos o que pretende fazer com esse poder. Só então o eleitor fará sua escolha.
Em resumo, não se pode privar os eleitores da chance de sonhar com um futuro melhor, em que prevaleçam a razão, o diálogo e o respeito à democracia – ainda que, ao fim e ao cabo, a vitória não venha.