Enxugando gelo na inflação

By | 09/07/2022 9:01 am

Em todos os grupos pesquisados pelo IBGE houve alta, mas o governo dobra aposta no voluntarismo e na gastança fiscal

Depois de ter desacelerado pontualmente em maio, a inflação voltou a dar mostras de sua força e consistência em junho. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou o mês passado em 0,67%, ante 0,47% em maio, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E com uma agravante: desta vez, todos os nove grupos pesquisados registraram alta de preços. Os dados confirmam a percepção de qualquer consumidor sobre a corrosão de seu poder de compra. O pior é que não há apenas um vilão para culpar pela inflação: de um total de 377 produtos e serviços pesquisados pelo IBGE, 252 ficaram ainda mais caros. As maiores variações foram verificadas nos grupos Vestuário e Saúde e Cuidados Pessoais. Influenciado por refeições fora do domicílio, o grupo Alimentos e Bebidas também pressionou o indicador. Em 12 meses, o IPCA acumula alta de 11,89%, décimo mês consecutivo em que os preços registram uma taxa superior a 10% – o que não ocorria há 20 anos.

Há ao menos um dado novo – e preocupante – no levantamento divulgado pelo IBGE. Os serviços, que vinham apresentando um comportamento mais benigno, voltaram a ser fonte de atenção, com alta de 0,90% em junho e de 8,74% em 12 meses – tudo isso a despeito de a taxa básica de juros ter chegado a 13,25%, a mais alta em cinco anos. É um comportamento que impõe um desafio ainda maior ao Banco Central (BC) neste ano e que confirma o difícil cenário econômico projetado para 2023, já que os reajustes nos serviços tendem a se propagar no tempo. Uma tarefa que já seria suficientemente penosa se torna inútil quando o Executivo apoia a gastança fiscal com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que rasga a Constituição e uma série de leis para autorizar o presidente Jair Bolsonaro a comprar votos para sua reeleição. A desastrosa PEC ainda nem foi aprovada pela Câmara, mas o mercado já cobrou seu preço, com a subida nas taxas de títulos do governo de longo prazo e o retorno das cotações do dólar a patamares próximos de R$ 5,30. Essa é uma conta que também chegará ao consumidor.

Não satisfeito em prejudicar o trabalho do BC, o esquizofrênico governo boicota a si mesmo. Já há quem projete que a imposição de um teto de 17% para o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de combustíveis – obsessão do presidente Jair Bolsonaro – pode até gerar deflação em julho, mas seus efeitos devem ser anulados pelo reajuste do Auxílio Brasil e pela criação de eleitoreiros benefícios para taxistas e caminhoneiros. Com mais dinheiro no bolso, haverá aumento na demanda por combustíveis, e isso tende a ser repassado ao consumidor em algum momento.

Não se trata de pessimismo, mas de um princípio econômico inexorável que ignora o voluntarismo dos desejos presidenciais. Conclamar apoiadores a verificarem se os postos de combustíveis baixaram o preço, num aggiornamento desesperado dos “fiscais do Sarney”, não terá nenhum efeito sobre a inflação – como não teve na desastrosa década de 1980.

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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