PEC KAMIKAZE é desproporcional, excessiva e afeta igualdade eleitoral, diz consultoria da Câmara

By | 14/07/2022 9:12 pm

PEC promulgada nesta quinta-feira pelo Congresso libera R$ 41,25 bilhões para o governo gastar e turbina benefícios sociais às vésperas da eleição

(Daniel Weterman, nO Estadão, 14 de julho de 2022)

 

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) “Kamikaze” cria um estado de emergência desproporcional e excessivo no final do mandato do presidente Jair Bolsonaro (PL), aumentando o risco fiscal, conforme nota da consultoria de orçamento da Câmara.

A PEC foi promulgada nesta quinta-feira, 14, pelo Congresso Nacional para turbinar benefícios sociais na véspera da eleição e liberar R$ 41,25 bilhões em gastos fora das principais regras fiscais e eleitorais do País.

Conforme os técnicos da Câmara, o estado de emergência decretado pela proposta é desproporcional e os gastos invertem o princípio democrático de isonomia entre os candidatos no período eleitoral. As críticas da consultoria se somam à opinião de outros especialistas, que alertaram nos últimos dias para os riscos fiscais da PEC patrocinada pelo governo e aprovada no Congresso, inclusive com o voto de integrantes da oposição.

O aumento do preço dos combustíveis não é motivo para uma medida tão drástica nas regras, na avaliação dos consultores, e o efeito prático pode ser aumento nos juros e no câmbio (desvalorizando ainda mais o real), ou seja, o inverso do pretendido. Nos bastidores, especialistas apontam que a PEC libera o caixa do governo para uma série de “pedaladas orçamentárias”, em referência às práticas do governo Dilma Rousseff (PT), com a diferença de que o governo Bolsonaro altera a lei para escapar das regras. Essas manobras podem vir por meio do pacote de projetos aprovado pelo Congresso na terça-feira, 12, e relevado pelo Estadão.

Com o estado de emergência decretado pela PEC, o governo ficará livre para aumentar o Auxílio Brasil de R$ 400 a R$ 600 até o final do ano e conceder outros benefícios driblando o teto de gastos, que limita o crescimento das despesas da União, a meta de resultado primário, que fixa a conta do governo entre despesas e receitas, e a regra de ouro, que proíbe o governo de se endividar para pagar despesas correntes. O estado de emergência é comparado ao estado de calamidade decretado em 2020, que permitiu o orçamento de guerra adotado em plena pandemia de covid-19.

“Ainda que a situação de ‘emergência’ seja menos grave, adota-se na PEC praticamente as mesmas dispensas e privilégios concedidos para situações mais críticas que caracterizam o estado de calamidade pública, o que não parece razoável. Abre-se mão de praticamente todo mecanismo de defesa fiscal de forma desproporcional à situação que se vislumbra”, diz a nota, elaborada a pedido da deputada Adriana Ventura (Novo-SP).

O Novo, único partido que orientou a rejeição da PEC “Kamikaze”, prepara uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar a proposta. A análise técnica deve servir de base para esse questionamento. “Nosso jurídico já está trabalhando na tese, mas é impressionante a velocidade com que o Congresso faz remendos casuísticos, e ao mesmo tempo é de uma letargia também impressionante quando se trata das reformas estruturais”, criticou o presidente do Novo, Eduardo Ribeiro.

 

Congresso Nacional
Congresso Nacional promulgou a ‘PEC Kamikase’ para turbinar benefícios sociais na véspera da eleição e liberar R$ 41,25 bilhões em gastos fora das principais regras fiscais e eleitorais do País  Foto: Dida Sampaio/Estadão

Um dos principais problemas da PEC “Kamikaze”, na avaliação dos técnicos, é a falta de uma fonte de recursos para bancar os gastos, necessidade básica de qualquer aumento de despesa no governo federal. No fim das contas, o governo vai acabar se endividando para cobrir as despesas. “Considerada a atual situação de déficit fiscal, a PEC, da forma como se encontra, em especial quanto ao fato de não prever compensação de despesas com caráter nitidamente continuado (Auxílio Brasil), atinge princípios basilares de equilíbrio das contas públicas e aumenta o risco fiscal, precedente que aparenta ser excessivo.”

A PEC foi uma saída do governo para autorizar os gastos e driblar a lei eleitoral, que proíbe a concessão de novos benefícios na véspera da disputa, o que na prática pode favorecer o presidente na tentativa de reeleição ao Planalto. “As regras que limitam despesas de final de mandato, ainda que constem apenas da legislação infraconstitucional (LRF e lei eleitoral), representam, em seu conjunto, princípio consolidado que garante uma disciplina fiscal ainda mais rigorosa nos períodos de transição. A PEC, ao criar o estado de emergência no final do mandato, com novas despesas, parece inverter o sentido democrático da legislação protetora da isonomia eleitoral”, diz a nota.

Além do risco fiscal, a PEC “Kamikaze” levanta questionamentos sobre a transparência dos gastos. A proposta limita os gastos aos benefícios elencados no texto. Diferente das despesas da covid-19, a medida não cria nenhum marcador específico no Orçamento para acompanhar a destinação final dos gastos. “Sem uma marcação, vai ser impossível acompanhar onde esses recursos estão sendo efetivamente gastos e se estão sendo gastos para as finalidades da PEC”, disse o economista Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas.

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Category: Destaques

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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