Inquéritos na gaveta

By | 27/07/2022 7:15 am

Procuradoria mostra submissão ao menosprezar denúncias contra atos de Bolsonaro na pandemia

Mulher branca loira, de meia idade, de cabelos compridos, com semblante sério. Veste tailleur e blusa escura e usa um colar delicado com um pequeno crucifixo dourado.
A vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, durante entrevista em Brasília. – Evaristo Sá – 11.jul.2022/AFP

São abundantes as evidências da negligência com que Jair Bolsonaro e seus auxiliares lidaram com a pandemia de Covid-19, que ceifou as vidas de mais de 677 mil brasileiros.

O presidente fez de tudo para sabotar o combate à doença. Boicotou medidas de proteção da população, investiu em tratamentos inócuos e postergou por meses a compra de vacinas que poderiam ter evitado milhares de mortes.

Nesta segunda (25), a Procuradoria-Geral da República fez pouco de tudo isso ao propor o arquivamento de 7 das 10 investigações iniciadas a partir das denúncias da Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado que examinou as ações do governo na crise sanitária.

Se o mandatário incentivou aglomerações e desrespeitou normas que prescreviam o uso de máscaras, ela argumentou, não se pode culpá-lo pelo comportamento dos que compareceram a seus eventos sem seguir as orientações médicas.

Bolsonaro pode ter feito vista grossa ao ser informado por um aliado de irregularidades nas negociações de vacinas no Ministério da Saúde, mas a procuradora concluiu que não há como incriminá-lo porque ele não tinha obrigação de agir diante das suspeitas.

Também não cabe reparo à aposta na cloroquina para enfrentar o coronavírus, porque o presidente tinha boas intenções. “Para o direito penal brasileiro, o agente que age sinceramente acreditando nos recursos de tratamento poderá até ser tido como inculto, mas não charlatão”, ela escreveu.

As respostas às imputações feitas pela CPI desafiam o bom senso, ofendem a memória das vítimas da calamidade e demonstram os riscos criados pela domesticação que Bolsonaro promoveu nas instituições encarregadas de fiscalizá-lo.

Desde a escolha de Augusto Aras para a chefia da Procuradoria, o mandatário passou a contar com um aliado contemporizador numa função essencial para sua sobrevivência política. Aras joga parado, e Bolsonaro ganha tempo com isso.

Como o procurador-geral é a única autoridade com poderes para propor ações contra o presidente na área criminal, o Supremo Tribunal Federal costuma acolher suas opiniões em casos assim, e é possível que o faça mais uma vez agora.

A deferência terá custo alto. Se Bolsonaro não conseguir novo mandato nas eleições de outubro, será difícil retomar as ações e responsabilizá-lo pela incúria na pandemia. Se for reeleito, ele só poderá responder por atos do primeiro mandato após deixar do cargo.

editoriais@grupofolha.com.br

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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