Walter Schalka, que está prestes a completar dez anos à frente da gigante de papel e celulose, diz que finalmente ‘caiu a ficha’ do setor produtivo em relação à política
A mobilização de empresários em torno de temas políticos nunca foi tão grande quanto a vista hoje, às vésperas das eleições presidenciais, afirma o presidente da gigante de papel e celulose Suzano, Walter Schalka. Segundo o executivo, o setor produtivo entendeu que tem, sim, a função de cobrar um planejamento estratégico para o País – algo que, em sua visão, não existe há muito tempo no Brasil.
Schalka, que foi um dos signatários da carta de defesa da democracia divulgada nesta terça-feira, 26, afirma que o Brasil está sem direcionamento em diversos temas, desde a questão ambiental até a educação. Por isso, ele defende o fim da polarização e cobra o debate de temas relevantes.
“Temos de buscar a pacificação do Brasil, a volta da esperança e a reunificação das famílias e de grupos de WhatsApp, em vez da polarização que estamos vivendo”, diz Schalka, que comanda uma gigante exportadora que só este ano vai investir mais de R$ 16 bilhões, com dois projetos de novas fábricas no Mato Grosso do Sul e no Espírito Santo.
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.
Qual é a sua expectativa em relação à eleição presidencial?
Deixando claro que esta é minha visão pessoal. Temos de buscar a pacificação do Brasil, a volta da esperança e a reunificação das famílias e de grupos de WhatsApp, em vez da polarização que estamos vivendo. Nesse contexto, é fundamental discutir os problemas reais que o Brasil tem, que são muito sérios. Eles precisam passar por soluções estruturantes. Temos de resolver a questão da educação, que, apesar de universalizada, é de baixa qualidade. Precisamos resolver a desigualdade social e a falta de emprego, assim como a ineficiência administrativa do Estado brasileiro. Temos uma oportunidade na questão ambiental que é tremenda. Precisamos sair da discussão pequena de um contra o outro e construir uma solução pró-Brasil.
Como o sr. vê a questão ambiental no País?
O Brasil tem uma oportunidade única no mundo. O aquecimento global é uma questão indiscutível. O que buscamos agora são formas de revertê-lo. Na minha opinião, isso tem a ver com a redução muito rápida das emissões de carbono, mas também a regeneração. O Brasil tem a maior floresta ambiental do mundo. Se o Brasil chegar aos países do hemisfério norte e propor cobrar bilhões de dólares ao ano pela sua preservação, é muito barato para o mundo. Além disso, há o problema social da Amazônia, que é seríssimo. Temos todas as condições de fazer negociações de cabeça erguida, para que a preservação da Amazônia se volte a todos os brasileiros, e não aos ilegais que se beneficiam do desmatamento. Essa oportunidade deveria estar no centro da discussão da próxima eleição.
Quanto ao papel do empresário na eleição, é importante que o empresariado se posicione em conjunto, encontrando um meio-termo?
Eu nunca vi, na minha experiência pessoal, a mobilização no mundo empresarial que estou vendo neste momento. Parece que caiu a ficha para todo mundo sobre o papel relevante que temos. Nossos votos são iguais aos das demais pessoas. Mas podemos ser líderes de opinião e colocar claramente (nossos posicionamentos) para todos os brasileiros e brasileiras. Isso ficou muito claro.
Falta projeto de país para o Brasil? Estamos à deriva?
Há muito tempo, o Brasil não tem planejamento estratégico. Quando um CEO assume uma empresa, a primeira coisa a se fazer é um planejamento estratégico. Quando um presidente é eleito, ele precisa pensar como Estado. Qual é o projeto para o futuro, qual será nossa inserção global e como gerar para o brasileiro uma qualidade de vida adequada? Não podemos ser só um exportador de commodities, como temos nos tornado. E isso não pode ser a base do Brasil para o futuro. Qual é a nossa inserção na questão da digitalização global? Tirando empresas como Embraer e Weg, que têm participação global expressiva fora das commodities, como viramos esse jogo e preparamos o Brasil para o futuro? Esse é um dos desafios que temos.
Em que fase estão os projetos em Mato Grosso do Sul e no Espírito Santo, que estão em andamento?
Temos múltiplos projetos. Temos um projeto de aumento de base florestal, estamos fazendo um retrofit da fábrica de Aracruz, com investimentos de mais de R$ 600 milhões. Neste momento, estamos construindo uma fábrica de celulose com investimentos na ordem de R$ 19 bilhões, sendo R$ 14,7 bilhões na parte industrial e todo o resto na área logística. Estamos terminando um terminal novo em Itaqui, no Maranhão. Nossa política é de reinvestir 90% da nossa geração de caixa. Em 2022, serão investidos R$ 16,1 bilhões. É um dos maiores programas de investimento privado do Brasil. No ano que vem, será algo da mesma magnitude.
Qual é o trabalho ambiental da Suzano?
Não temos pegada ambiental. Nossa pegada é negativa, somos carbono negativo. Ampliamos nossa base florestal, mas também preservamos 1 milhão de hectares (de floresta nativa). Vamos aumentar nossa base de preservação e plantaremos 30 mil hectares de florestas nativas. Além disso, plantamos 800 mil árvores por dia, 365 dias por ano. É o maior programa de plantio florestal do mundo, disparado. Isso envolve mudas, áreas, clones adequados e 20 mil pessoas. Essa é nossa filosofia para o mundo reduzir a nossa emissão, mas a população também precisa ajudar nessa missão. A segunda missão é aumentar a regeneração de áreas nativas.
Tem crescido a importância das marcas próprias da Suzano, voltadas ao varejo?
Há quatro anos, esse negócio de bens de consumo era uma apresentação de PowerPoint. Saímos do zero, e os analistas me perguntavam qual era a vantagem competitiva, porque não tínhamos marcas e distribuição. Dizia que tinha competitividade de custos e ICMS acumulado. Como somos exportadores, recebemos créditos e temos ICMS zerado na saída. Estávamos empoçando ICMS. Para resolver isso, montamos essa operação. Hoje, temos 60% do mercado no Norte, 28% do Nordeste e somos líderes no Rio e no Espírito Santo. Saímos do zero e estamos em plena capacidade. Demos um novo passo com a nossa unidade em Aracruz. Hoje, temos marca e distribuição, tudo construído dentro de casa.
O Brasil está preso ao agronegócio, mas isso tem suas vantagens, como deixar o País mais resistente à atual crise global.
O agronegócio é fundamental para ter estabilidade fiscal e econômica do Brasil. Com a nossa política fiscal está muito longe do que deveria ser, principalmente com a ‘PEC Kamikaze’ e com o estouro recorrente do teto de gastos, podemos ter uma situação de dívida interna muito complexa nos próximos anos. Quem mitiga e minimiza isso é o agronegócio.
Quando serão lançadas as novas fábricas?
A fábrica de Aracruz será a número um do mundo em termos de competitividade. Estamos dentro do cronograma e temos 21% concluídos. São 4 mil trabalhadores na obra, número que chegará a 10 mil nos próximos meses. Queremos ampliar nossa competitividade de custo para entrar em outros negócios. Estamos trabalhando com celulose para ser utilizada em roupas. Temos uma startup na Finlândia, a Spinnova, que tem duas fábricas, incluindo uma no Brasil, em modelo piloto. Também acreditamos que a árvore vai servir de base para a produção do bio-óleo para substituir combustíveis fósseis.
Há planos para eletrificação da frota de caminhões da Suzano?
Imaginamos que chegaremos lá. Queremos que os caminhões de madeira, em volta da fábrica, saiam no diesel. Pode ser o bio–óleo ou algum motor eletrificado, porque somos produtores de energia, e vendemos energia para o grid (mercado aberto). Dividimos as árvores em duas partes, uma é a lignina, que queimamos e geramos energia através de turbinas, e a outra é a fibra, que vai virar celulose. Na fábrica nova, geraremos 180 gigawatts de energia livre, fora o que será usado pela própria fábrica.
O que a empresa faz para desenvolver socialmente as comunidades nas cidades onde atua?
São três metas ESG. A primeira é sequestrar 40 milhões de toneladas de carbono até 2025. A segunda é tirar 10 milhões de toneladas de plásticos da natureza até 2030. A terceira é tirar 200 mil pessoas da pobreza, buscando dar renda sustentável para as comunidades e dando educação para a próxima geração. Temos um projeto de mel: somos o maior produtor de mel do Brasil, e 100% da receita vai para as comunidades. Damos equipamentos e a comunidade produz o mel, que ajudamos a vender e damos a rentabilidade para ela. Isso gera renda para a comunidade. Agora, estamos ajudando a exportar o mel.
A empresa manterá o pagamento de dividendos aos acionistas mesmo com a política de reinvestimentos?
Fizemos um pagamento de R$ 1,8 bilhão aos acionistas, perante uma geração de R$ 23 bilhões. Nossa política é pagar 10% da geração de caixa ou 25% do lucro líquido, o que for menor. Ou seja, pagamos dividendos, mas o retorno sobre o capital empregado é melhor do que o que deixamos para o acionista. É melhor continuar a reinvestir.