Levantamento preliminar da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) identificou 26 casos de violência contra profissionais da imprensa em menos de 48 horas, entre domingo e segunda-feira, em diferentes cidades do País. Como noticiou o Estadão, repórteres e fotógrafos que cobriam os atos golpistas em Brasília foram atacados com chutes, socos e empurrões, além de terem equipamentos destruídos ou roubados.
No Twitter, a jornalista Marina Dias, que fazia a cobertura para o jornal norte-americano The Washington Post, contou ter sido perseguida até a garagem do Ministério da Defesa, na Esplanada dos Ministérios. “Fui cercada, chutada, empurrada, xingada. Quebraram meus óculos, puxaram meu cabelo”, contou. Outro profissional do jornal O Tempo fez um relato estarrecedor: disse ter sido “detido” por cerca de meia hora por golpistas que haviam invadido o Senado, com uma arma apontada para a cabeça e outra às costas. Contou ter levado tapas no rosto, além de ter o dinheiro da carteira roubado.
Desde o fim do segundo turno das eleições até a véspera dos atos golpistas, o monitoramento feito pela Abraji, em parceria com a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), havia registrado outros 78 casos de hostilidades e agressões a profissionais da imprensa. Ora, cada episódio de intimidação e violência contra jornalistas atinge toda a sociedade, em tentativa de subtrair o direito fundamental à informação.
A hostilidade à imprensa, é bom lembrar, não tem cor partidária nem se restringe a um lado do espectro ideológico. No caso do bolsonarismo, porém, ofensas e agressões a jornalistas viraram uma espécie de modus operandi, como se fosse uma forma a mais de manifestação política: o desprezo pelos fatos é também desprezo e perseguição contra quem tem, por profissão, de apurar e relatar os fatos. Chama a atenção que justamente quem levanta a bandeira da liberdade de expressão queira calar − com intimidações, ofensas e, não raro, com murros e pontapés − a voz da imprensa livre. É notório que o número de relatos de violência contra jornalistas cresceu durante o governo de Jair Bolsonaro, ele próprio um crítico contumaz do trabalho da imprensa.
A Associação Nacional de Jornais (ANJ) condenou “veementemente” os crimes contra a democracia e contra jornalistas no exercício de suas atividades no dia 8 de janeiro em Brasília. “A liberdade de imprensa é inerente ao Estado Democrático de Direito, que não pode tolerar ou conviver com a baderna e o vandalismo”, disse a ANJ.
Não há sociedade livre sem liberdade de imprensa. Não há democracia sem liberdade de imprensa. E pode-se dizer igualmente: não há sociedade livre sem lei, não há democracia sem lei. Aqueles que almejam impor sua vontade desrespeitando a lei e a liberdade de imprensa nada constroem, como mostram os atos de domingo em Brasília.
Assim como não se defende a causa da liberdade com violência e agressão, a bandeira do patriotismo não é levantada por meio da destruição do patrimônio público. As cenas de vandalismo nas sedes dos Três Poderes são a antítese da defesa da Pátria. Não há patriotismo onde viceja o desrespeito à lei e à ordem.
É uma total contradição: pessoas cobertas com a Bandeira Nacional destruíram obras de arte que fazem parte da história do Brasil. A pintura Mulatas, de Di Cavalcanti, sofreu seis golpes de instrumentos perfurantes. Outras muitas obras foram danificadas e roubadas durante os atos de vandalismo. É uma contradição, mas é também, não há como negar, um fiel retrato do bolsonarismo: em nome da liberdade, a barbárie, em suas mais variadas formas.
Comentário do programa
Ao destruir obras de arte e agredir jornalistas, os vândalos de Brasilia demonstraram o que realmente são: bandidos. (LGLM)