Em nome da liberdade, a barbárie (seguido de comentário nosso)

By | 11/01/2023 6:01 am

Ao agredirem jornalistas e destruírem obras de arte, os golpistas do 8 de janeiro escancararam uma vez mais as contradições do bolsonarismo. Não há liberdade sem respeito à lei

 

(OPINIÃO DO ESTADÃO, em 11/01/2023)

 

Imagem ex-libris

O bolsonarismo diz agir em defesa da liberdade de expressão, mas não perde a oportunidade de ameaçar e agredir jornalistas. Foi assim durante a invasão do Congresso, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal (STF) no domingo. O mesmo se repetiu nas recentes desocupações de acampamentos em frente a quartéis. Eis uma flagrante contradição: os pretensos defensores da liberdade de expressão atuam contra a liberdade de imprensa.

Levantamento preliminar da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) identificou 26 casos de violência contra profissionais da imprensa em menos de 48 horas, entre domingo e segunda-feira, em diferentes cidades do País. Como noticiou o Estadão, repórteres e fotógrafos que cobriam os atos golpistas em Brasília foram atacados com chutes, socos e empurrões, além de terem equipamentos destruídos ou roubados.

No Twitter, a jornalista Marina Dias, que fazia a cobertura para o jornal norte-americano The Washington Post, contou ter sido perseguida até a garagem do Ministério da Defesa, na Esplanada dos Ministérios. “Fui cercada, chutada, empurrada, xingada. Quebraram meus óculos, puxaram meu cabelo”, contou. Outro profissional do jornal O Tempo fez um relato estarrecedor: disse ter sido “detido” por cerca de meia hora por golpistas que haviam invadido o Senado, com uma arma apontada para a cabeça e outra às costas. Contou ter levado tapas no rosto, além de ter o dinheiro da carteira roubado.

Desde o fim do segundo turno das eleições até a véspera dos atos golpistas, o monitoramento feito pela Abraji, em parceria com a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), havia registrado outros 78 casos de hostilidades e agressões a profissionais da imprensa. Ora, cada episódio de intimidação e violência contra jornalistas atinge toda a sociedade, em tentativa de subtrair o direito fundamental à informação.

A hostilidade à imprensa, é bom lembrar, não tem cor partidária nem se restringe a um lado do espectro ideológico. No caso do bolsonarismo, porém, ofensas e agressões a jornalistas viraram uma espécie de modus operandi, como se fosse uma forma a mais de manifestação política: o desprezo pelos fatos é também desprezo e perseguição contra quem tem, por profissão, de apurar e relatar os fatos. Chama a atenção que justamente quem levanta a bandeira da liberdade de expressão queira calar − com intimidações, ofensas e, não raro, com murros e pontapés − a voz da imprensa livre. É notório que o número de relatos de violência contra jornalistas cresceu durante o governo de Jair Bolsonaro, ele próprio um crítico contumaz do trabalho da imprensa.

A Associação Nacional de Jornais (ANJ) condenou “veementemente” os crimes contra a democracia e contra jornalistas no exercício de suas atividades no dia 8 de janeiro em Brasília. “A liberdade de imprensa é inerente ao Estado Democrático de Direito, que não pode tolerar ou conviver com a baderna e o vandalismo”, disse a ANJ.

Não há sociedade livre sem liberdade de imprensa. Não há democracia sem liberdade de imprensa. E pode-se dizer igualmente: não há sociedade livre sem lei, não há democracia sem lei. Aqueles que almejam impor sua vontade desrespeitando a lei e a liberdade de imprensa nada constroem, como mostram os atos de domingo em Brasília.

Assim como não se defende a causa da liberdade com violência e agressão, a bandeira do patriotismo não é levantada por meio da destruição do patrimônio público. As cenas de vandalismo nas sedes dos Três Poderes são a antítese da defesa da Pátria. Não há patriotismo onde viceja o desrespeito à lei e à ordem.

É uma total contradição: pessoas cobertas com a Bandeira Nacional destruíram obras de arte que fazem parte da história do Brasil. A pintura Mulatas, de Di Cavalcanti, sofreu seis golpes de instrumentos perfurantes. Outras muitas obras foram danificadas e roubadas durante os atos de vandalismo. É uma contradição, mas é também, não há como negar, um fiel retrato do bolsonarismo: em nome da liberdade, a barbárie, em suas mais variadas formas.

Comentário do programa

Ao destruir obras de arte e agredir jornalistas, os vândalos de Brasilia demonstraram o que realmente são: bandidos. (LGLM)

Comentário

Category: Blog

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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