Governo e Congresso precisam rever regulação que facilita o garimpo clandestino
(Editorial da Folha, em 06/02/2023)
É fato que o debate sobre a lavra garimpeira em terras indígenas e áreas de preservação ambiental sofreu retrocessos nos quatro anos de Jair Bolsonaro (PL). No entanto também é fato que a procrastinação no combate ao avanço da atividade na região amazônica precede o governo anterior.
O controle dessa extração é negligenciado há décadas, inclusive pelos estados que, não raro, emitem leis regionais a favor de garimpeiros —o que conflita com a Constituição, dado que invadem áreas sob a esfera federal.
Pesquisas indicam que ao menos 30% do ouro brasileiro apresenta indícios de irregularidades e boa parte sai das terras de povos como areõe, xikrin, kayapó, kayabi, além dos yanomamis.
Contudo, além de apoiar os indígenas, retirar os garimpeiros e adotar procedimentos para recuperar o território arrasado, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) precisa ser ágil na mudança do arcabouço institucional que favorece a legalização e garante os ganhos desse ouro ilegal.
Não há negócio, lícito ou ilícito, que persista sem lucros, e a facilidade para “esquentar” o ouro do garimpo ilegal incentiva o crime, como sustentam especialistas.
Aponta-se que a Receita Federal, órgão ligado ao Executivo, preserva há mais de 20 anos uma instrução normativa que prevê nota fiscal de papel no trânsito do ouro como ativo financeiro. Essa medida pode estimular fraudes e lavagem de dinheiro, além de prejudicar a fiscalização da origem do metal e as investigações da Polícia Federal.
A Lei 12.844, sancionada em 2013, instituiu a declaração de boa-fé na venda do ouro de garimpo para instituições financeiras, o que, de acordo com estudiosos, gera proteção para quem compra o metal de origem suspeita.
Esse instrumento dificultaria ainda a ação do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários contra distribuidoras de títulos e valores mobiliários acusadas de conivência com garimpeiros.
O Legislativo tem os meios para modernizar as normas legais dessa atividade. Há projetos em tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado que buscam o ambiente regulatório para instituir a rastreabilidade do ouro.
No mínimo, os textos propiciam a oportunidade para discussão aprofundada e entendimento político em torno do tema, fundamental para o futuro dos yanomamis.
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Comentário nosso
Assim é “rabo cheio” para quem compra ouro de origem ilegal. O comprador vai ao banco assina um documento afirmando que o ouro é de origem legal e a partir daí o ouro entra em circulação como se tivesse origem legal, como se fosse extraido de garimpo legal. Seria a mesma coisa que o cidadão comprar algo roubado, vender com uma declaração de que comprou ao dono legítimo e evitar de ser preso por receptação. Quem aprovou esta lei deve estar querendo encobrir a roubalheira alheia. (LGLM)