Ponto para Haddad

By | 02/03/2023 8:27 am

Com reoneração dos combustíveis, ministro marcou um ponto de inflexão que será fundamental para projetar os próximos passos da política econômica e fiscal

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(Felipe Salto, Economista-chefe e sócio da Warren Renascença, professor do IDP, foi secretário da Fazenda e Planejamento de São Paulo e o primeiro diretor-executivo da IFI. Felipe Scudeler Salto escreve quinzenalmente na seção Espaço Aberto, no Estadão, em 02/03/2023)

Foto do autor: Felipe Salto

As medidas anunciadas na terça-feira passada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foram positivas, sobretudo no aspecto da preservação da estratégia de política fiscal para 2023. Prevaleceu a posição da Fazenda, a despeito das opiniões contrárias à reoneração do PIS e da Cofins (dois tributos federais importantes para a arrecadação) sobre a gasolina e o álcool. A melhor política pública não é atender a todos os que batem à porta do governo, mas organizar e avaliar essas demandas com planejamento para gerar os melhores resultados à coletividade. Ponto para Haddad.

Esta novela dos combustíveis começou embalada por iniciativas populistas patrocinadas pelo governo anterior. Lá, a aproximação das eleições levou à redução dos impostos. A conta, como sempre, recai sobre toda a sociedade, que acaba subsidiando indiretamente o consumo de combustíveis. Pior, espetaram faturas por todos os lados, inclusive nos Estados, que se viram obrigados a fixar alíquotas incompatíveis com seus orçamentos aprovados para o ano.

Em São Paulo, naquele momento, eu era o secretário da Fazenda e nós cumprimos, sim, a legislação, mas advogamos no Supremo Tribunal Federal para obter as devidas compensações federais. Mérito do governador Rodrigo Garcia e de toda a equipe, sobretudo dos nossos auditores fiscais da Receita Estadual e procuradores do Estado, a quem não me canso de render homenagens. Uma burocracia weberiana de verdade.

O problema é que nem sempre o populista arca com suas estripulias. Não raro, as deixa como herança. É muito mais fácil assumir o discurso de que seria possível evitar a reoneração dos combustíveis sem prejudicar a saúde das contas públicas. Felizmente, prevaleceu, agora, a posição do Ministério da Fazenda, que fez cavalo de batalha e venceu.

Isso é bom não apenas porque restituirá uma montanha de receitas necessárias para garantir o financiamento de políticas públicas previstas no Orçamento de 2023, mas também pelo que simboliza para a frente. O mercado está à espera de um novo arcabouço fiscal, capaz de corrigir a confusão promovida no teto de gastos (limite para o crescimento das despesas) ao longo dos últimos anos.

O próprio ministro Fernando Haddad e sua equipe estão mais fortalecidos para apresentar uma proposta para as regras fiscais ao Congresso Nacional e, assim, dar a batalha pela sua célere aprovação. Mesmo raciocínio vale para a reforma tributária, em relação à qual sou mais cético, mas cujo debate precisa ser aprofundado no Parlamento. Ela teria o condão de corrigir uma série de distorções do sistema tributário do ICMS, tema que abordarei na próxima quinzena neste espaço.

Vamos aos números sobre a reoneração da gasolina, a partir das contas que fiz ontem para nossos clientes na corretora Warren Rena. Elas mostram que a nova alíquota de PIS/Cofins, de R$ 0,47 por litro, combinada com a alíquota de R$ 0,02 por litro para o álcool, produziria uma arrecadação adicional de cerca de R$ 20 bilhões, sob a hipótese de manutenção dessa lógica até o fim do ano. Para chegar aos cerca de R$ 29 bilhões esperados pelo governo no “pacote fiscal de janeiro”, faltariam, então, R$ 9 bilhões.

A medida complementar anunciada foi um imposto sobre as exportações de petróleo bruto com alíquota de 9,2%. As contas do governo indicam que seria possível arrecadar cerca de R$ 7 bilhões com essa alíquota. A nosso ver, ela precisaria ser um pouco mais alta, da ordem de 11%, para garantir os R$ 29 bilhões mencionados. No entanto, nada impede que se recalibrem esses valores ao longo do tempo, lembrando ainda que a tributação das exportações de petróleo será temporária, por quatro meses.

Pode-se argumentar que a reoneração promovida seria ruim para os consumidores. Será?

Ora, ruim para os mais pobres, isso sim, é jogar pela janela os recursos do erário com o objetivo de subsidiar consumo de combustível fóssil, diretriz do governo Bolsonaro. Era preciso escapar dessa esparrela, e Haddad conseguiu liderar o processo de saída, marcando um ponto de inflexão que será fundamental para projetar os próximos passos da política econômica e fiscal.

Winston Churchill cunhou uma expressão que deveria ser o mantra de todos os políticos sérios: jamais ceder, a não ser por convicções de honra e bom senso. Mesmo que possa parecer custoso defender a reoneração diante da população que abastece seus automóveis todos os dias e poderá enfrentar algum reajuste nos postos de gasolina, o correto a fazer é exatamente isso.

É garantir bilhões de reais que servirão para financiar auxílios sociais, gastos com saúde, educação, segurança, seguro-desemprego e tantas políticas previstas no Orçamento, sem prejudicar o equilíbrio fiscal. Mais: restabelecer o diferencial competitivo entre gasolina e álcool, em benefício do meio ambiente.

A melhor resposta da política não é necessariamente atender a todas as demandas que apareçam pela frente. A boa política é o oposto disso: fazer escolhas duras e mostrar como serão melhores e como ajudarão a promover maior bem-estar a todos, sobretudo para aqueles que mais dependem do Estado.

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ECONOMISTA-CHEFE E SÓCIO DA WARREN RENA, FOI SECRETÁRIO DA FAZENDA E PLANEJAMENTO DO ESTADO DE SÃO PAULO E O PRIMEIRO DIRETOR-EXECUTIVO DA IFI

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Category: Opinião

About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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