Desde o início de 2019 já vieram os sinais de que ele não tinha apetite para governar o País nem prurido em manipular Polícia Federal, Coaf, Receita, Petrobras, Caixa Econômica Federal, Itamaraty, Forças Armadas e tudo o mais. Só pensava naquilo: reeleição. Passava panos quentes nos malfeitos de filhos e amigos e perseguia os adversários.
A boa notícia é que há resistência, que borbulhou em setores da sociedade e se alastrou pela máquina pública, dividindo ministérios e órgãos entre bolsonaristas prontos a fazer tudo o que seu mestre mandasse e funcionários de carreira, concursados, determinados a seguir a Constituição, leis e regras.
Os dois estojos de joias, um masculino, já embolsado por Bolsonaro como presente “personalíssimo”, e outro feminino, apreendido em Guarulhos, são o fio da meada de uma grande aula sobre essa divisão. Enquanto ele manipulava a cúpula da Receita e do governo, a corporação se movia para se autoproteger e fazer valer as regras. Daí o choque.
Em Brasília, o secretário da Receita, chefão do órgão, atendia às pressões do presidente e telefonava para um subordinado em Guarulhos para que liberasse – sem poder – as joias de R$ 16,5 milhões presenteadas à primeira-dama pela Arábia Saudita. Aliás, como um subordinado que acessou criminosamente os dados fiscais de adversários do presidente e de um procurador que investigava as rachadinhas dos Bolsonaros.
Na base, lá estavam fiscais como Marco Antônio Santana, que recebeu o sargento enviado pelo Planalto em avião da FAB e disse sucessivos e sonoros “não”: ao ofício do governo, ao telefonema do tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro, ao chamado do secretário da Receita, Julio Cesar Gomes, chefe dele. Ou seja: disse não ao presidente da República. E com razão.