Escândalo das ‘joias das Arábias’ expõe racha na máquina pública durante o governo Bolsonaro

By | 10/03/2023 6:46 am

Em Brasília, os paus-mandados cediam às pressões; na base, os servidores diziam sonoros ‘não’

(Eliane Cantanhêde, coluna no Estadão, em 10/03/2023)

Foto do autor: Eliane Cantanhêde

Desde o início de 2019 já vieram os sinais de que ele não tinha apetite para governar o País nem prurido em manipular Polícia Federal, Coaf, Receita, Petrobras, Caixa Econômica Federal, Itamaraty, Forças Armadas e tudo o mais. Só pensava naquilo: reeleição. Passava panos quentes nos malfeitos de filhos e amigos e perseguia os adversários.

A boa notícia é que há resistência, que borbulhou em setores da sociedade e se alastrou pela máquina pública, dividindo ministérios e órgãos entre bolsonaristas prontos a fazer tudo o que seu mestre mandasse e funcionários de carreira, concursados, determinados a seguir a Constituição, leis e regras.

Joias de três milhões de euros não foram entregues a Michelle Bolsonaro porque foram apreendidas pela Receita Federal pela tentativa de entrada ilegal no País
Joias de três milhões de euros não foram entregues a Michelle Bolsonaro porque foram apreendidas pela Receita Federal pela tentativa de entrada ilegal no País
Joias de três milhões de euros não foram entregues a Michelle Bolsonaro porque foram apreendidas pela Receita Federal pela tentativa de entrada ilegal no País Foto: DIV e Wilton Junior/Estadão

Os dois estojos de joias, um masculino, já embolsado por Bolsonaro como presente “personalíssimo”, e outro feminino, apreendido em Guarulhos, são o fio da meada de uma grande aula sobre essa divisão. Enquanto ele manipulava a cúpula da Receita e do governo, a corporação se movia para se autoproteger e fazer valer as regras. Daí o choque.

Em Brasília, o secretário da Receita, chefão do órgão, atendia às pressões do presidente e telefonava para um subordinado em Guarulhos para que liberasse – sem poder – as joias de R$ 16,5 milhões presenteadas à primeira-dama pela Arábia Saudita. Aliás, como um subordinado que acessou criminosamente os dados fiscais de adversários do presidente e de um procurador que investigava as rachadinhas dos Bolsonaros.

Na base, lá estavam fiscais como Marco Antônio Santana, que recebeu o sargento enviado pelo Planalto em avião da FAB e disse sucessivos e sonoros “não”: ao ofício do governo, ao telefonema do tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro, ao chamado do secretário da Receita, Julio Cesar Gomes, chefe dele. Ou seja: disse não ao presidente da República. E com razão.

Para concluir, é importante ter funcionários exemplares, com compromisso e honradez, mas isso não basta. É preciso regras, fiscalização, controle. Não custa lembrar: assim como a mortandade nas operações policiais de São Paulo diminuiu com câmeras nas fardas, certamente a eficácia da Receita aumentou com as câmeras nas aduanas. Bom para a Receita e para o auditor, péssimo para Bolsonaro e seus paus-mandados. Está tudo lá, gravado, demolidor.

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About Luiz Gonzaga Lima de Morais

Formado em Jornalismo pelo Universidade Católica de Pernambuco, em 1978, e em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1989. Faz radiojornalismo desde março de 1980, com um programa semanal na Rádio Espinharas FM 97.9 MHz (antiga AM 1400 KHz), na cidade de Patos (PB), a REVISTA DA SEMANA. Manteve, de 2015 a 2017, na TV Sol, canal fechado de televisão na cidade de Patos, que faz parte do conteúdo da televisão por assinatura da Sol TV, o SALA DE CONVERSA, um programa de entrevistas e debates. As entrevistas podem ser vistas no site www.revistadasemana.com, menu SALA DE CONVERSA. Bancário aposentado do Banco do Brasil e Auditor Fiscal do Trabalho aposentado.

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